domingo, 7 de dezembro de 2014

A um amigo que se foi



Dias atrás ao olhar distraidamente para uma pessoa na rua pude ver nela, não sei a razão, um amigo que já não se encontra mais no plano visível. Estranha sensação esta, a de sentir tão próximo, pessoas que já se foram, como se bem ali na esquina pudéssemos conversar sobre assuntos da vida que segue. Pude notar aquele mesmo jeito desleixado de cuidar sem se cuidar, o corpo permanentemente esguio, a usual camisa branca de manga curta por sobre a calça jeans surrada e o sapato igualmente desgastado por tanto caminhar. Na face, a barba sem fazer e os óculos esperando sempre o auxílio das mãos, aquelas mesmas que seguravam a pasta preta contendo sabe-se lá o quê.
Peguei-me então, falando aquelas frases introdutórias e tão banais do cotidiano. “E aí? Como estão as coisas? Só na correria?”. E a resposta acompanhada daquele sorriso comum entre os que se reconhecem amigos.  “Estamos aí, correndo atrás do prejuízo. Não pode é parar, né?” (Ironia constatar que a vida para de repente apesar ou em razão de tanto correria).
Como era hora do almoço resolvemos colocar a prosa em dia em um restaurante que também já havia encerrado suas atividades. Um local de muitos encontros entre outros amigos e que apelidamos de “Without family”, freqüentado apenas por aqueles que julgávamos “sem família”.  
E voltamos a falar da mulher que amávamos e aquelas que passaram por nós sem amor. Rimos com as piadas de sempre e os micos que pagamos nas amizades compartilhadas de um universo ainda sem internet. Discutimos sobre a eterna política sem solução, o clima das quatro estações em um mesmo dia, o futebol em queda e a inflação em alta.
Por fim, o relógio ainda nos pulsos, trouxe-nos de volta a urgência nas tarefas ainda a cumprir. Despedimo-nos com um abraço imenso que mais parecia um laço a amarrar nossas vidas em um presente eterno.

Ao chegar em casa e em tempos de facebook, acessei sua página e pude ler suas postagens sempre hilárias e suas fotos. Tudo comprovando que a vida continua e que o seu coração insistia em pulsar, mesmo que a ciência tenha diagnosticado o contrário. Nesta certeza, não resistir e postei na mesma página a seguinte mensagem a aguardar sua pronta resposta.  “E aí? Como estão as coisas? Só na correria?”.