terça-feira, 24 de junho de 2014

Eu, o Vinho e Humphrey Bogart


Confesso. Achava verdadeira frescura quando em um restaurante, ou mesmo em um evento, notava algumas pessoas com taças de vinho na mão fazendo “caras e bocas”.  Estariam pensando em serem fotografadas para a revista Caras? Pensavam ser “esse cara sou eu”? Certa vez, tive a pachorra, a paciência, em um restaurante de ficar imitando um sujeitinho que em mesa próxima, ao saborear um vinho, fazia ares de Humphrey Bogart no filme Casablanca. (alguém se lembra?).  
Vinho para mim era para ser tomado (assim mesmo) como qualquer outro tipo de bebida, e, preferencialmente no inverno. A única diferença era o vasilhame (taça).  Assim como quem achava existir apenas 2 tipos de mulheres (as nacionais e as estrangeiras) acreditava também existir apenas 2 tipos de vinho: o branco e o tinto. O tal do vinho rose para mim era uma mistura indesejável do branco com o tinto, apenas isto. Espumante era literalmente, um vinho com gás, tão somente isto.
Se você pensa que comprei uma garrafa azul de Liefbraumilch como se fosse o melhor vinho do mundo, você está totalmente enganado. Não comprei apenas uma garrafa, comprei várias, inclusive presenteei amigos. Afinal, verdadeiramente não existe presente melhor para amigos de verdade do que um vinho de verdade. Naquela época, era verdadeiro também o seguinte: mesmo que a gente não conseguisse pronunciar, quanto mais consoantes tivesse o nome do vinho que a gente bebia, mais chique a gente se sentia.
Hoje, conheço ainda muito pouco desta bebida milenar. Contudo, fruto de algumas palestras e cursos, já sei algumas diferenças entre o branco, o tinto e o rose (que não é somente a cor) e reconheço a magia, o encantamento e o prazer de degustar um vinho utilizando todos os recursos de minhas papilas degustativas (eu nem sabia possuir este acessório na língua).
Certo, me falta muito para ser sommelier, um verdadeiro connaisseur (para rimar e fazer biquinho em francês) do universo vinícola, mas quando vejo alguém com uma taça de vinho na mão e percebo alguns gestos de quem está gostando e degustando, sei que ali acontece bem mais que o ato de ingerir uma bebida.

Começa ali um encontro, um momento especial, mágico e lúdico. E posso hoje, compreender melhor, um cavalheiro que com uma taça de vinho na mão fazia cara de Humphrey Bogart a esperar por sua Ingrid Bergman. 

Reflexões Matinais Rápidas



Algumas coisas em minha vida não deram lá muito certo. Talvez por desentendimento celestial em relação ao que eu estava querendo dizer. Dois exemplos ilustram isto. Um dos meus desejos era ir para a França e ver Paris do alto. Acabei em São Paulo no Alto do Pari. Recentemente, mais modesto, manifestei aos céus o meu desejo de conhecer o Chile. Não é que estes dias uns amigos de Poços marcaram um encontro comigo no bar Chili`s na Praça Pedro Sanches (nada contra). Ultimamente, tenho pensando muito em ir para Chicago, mas estou revendo este meu desejo, vai que...

terça-feira, 10 de junho de 2014

Brincar de outra coisa



Admiro (mas não posso dizer que me encanto) ouvir pessoas que sabem a Bíblia de “cor e salteado” e citam várias passagens da “Palavra de Deus”. Sinceramente, me cheira coisa de advogado que ao decorar o Código Penal, acredita ser excelente jurista. 
Mas, deixando tal considerando de lado e indo aos finalmente, quando ouço alguém citar aquela passagem de Jesus em sua fala “deixai vir a mim as crianças, porque delas é o reino dos Céus” (Mateus 19 ,13-15), tenho a certeza absoluta de que Ele queria é despertar a criança existente em cada um de nós.
Contudo, redescobrir o menino ou menina em meio a tanta “adultíce” para não dizer adultério, não é tarefa das mais fáceis. Por isto, por vezes, fico a reparar o comportamento das crianças buscando tirar delas algum ensinamento.
Assim, “ustrudia” estava eu a observar duas crianças brincando, quando em determinado momento o brinquedo que as divertia se quebrou. Observei então que elas até tentaram consertá-lo, mas, foi inútil. Não havia nada a fazer. Pensei - com minha cabeça de gente grande-: E agora, o que farão? Sairão correndo pra casa chorando e pedindo o auxílio dos pais?
A resposta veio no instante seguinte.
Uma delas virou para a outra e livremente proclamou: “Ah! Vamos brincar de outra coisa”.
E seguiram alegres como só elas sabiam ser.
Em determinada época de nossa vida, algo que parecia-nos o bem mais precioso, aquilo que nos fazia realmente felizes, se vai, se quebra, se despedaça em nossas mãos e tristes e apegados perguntamos aos céus: O que fazer?
O melhor ensinamento talvez seja este. O de ouvir a criança que existe em cada um de nós, seguir em frente e exclamar como quem descobriu a liberdade: - Ah! Vou brincar de outra coisa.

sábado, 7 de junho de 2014

A Copa e a Cozinha


Impossível ficar apático. Basta andar pelas ruas, conversar com as pessoas, ouvir o noticiário. O país passa por uma situação difícil e nós brasileiros estamos inseguros com o presente e incrédulos com o futuro. E não há nada pior que perder a fé no amanhã. Irão dizer que faz tempo que as coisas estão assim em uma tentativa de diluir os acontecimentos, tirardeles a força, reduzir seus impactos. Irão dizer que tal fala é um golpe para enfraquecer a democracia, impedir o desenvolvimento, sabotar determinada candidatura. O discurso vazio chega como fumaça para tentar impedir a visibilidade do momento que atravessamos. Os fatos se sobrepõem às ideologias, descortinam a retórica, evidenciam os eufemismos, denunciam as dissimulações.
O Brasil vive a fantasia da Copa do Mundo e os malabares do circo buscam nos tirar o foco da realidade. Contudo, não reduz a dor civil de um país que se desgoverna no cotidiano. É a corrupção crescente, a crise na Petrobrás, a violência e as drogas nas ruas, a inflação que volta a ameaçar e, o que é pior, as instituições políticas, criminais, legislativas e judiciárias sem a credibilidade necessária para minimizar os impactos sociais e econômicos que o país sofre.
Sim, claro, iremos agitar nossas bandeiras, ficaremos com os olhos grudados na televisão torcendo para a seleção brasileira ou estaremos nos estádios assistindo aos jogos. Contudo, a Copa não esconde a cozinha. São pilhas de pratos e talheres sujos acumulados há anos e tão logo o evento mundial acabe, voltaremos novamente a pensar em quem poderá arruma-la. Ganhar a Copa do Mundo poderá nos deixar eufóricos e alegres por algum tempo, como uma droga que inebria e camufla a realidade. Perder a Copa nos fará voltar mais cedo para casa e dar de cara novamente com a nossa cozinha. O brasileiro comum está então dividido entre o entretenimento que a Copa proporciona e alivia um pouco a dor e os tantos carnês que necessita saldar, em meio à violência e a saúde tão debilitada.
Chegará então o momento eleitoral, que embora seja um instrumento democrático para depositar nosso voto de protesto ou mesmo de crença em algum partido ou pessoa, tem se constituído em mais um placebo para curar tantas doenças sociais, já que a descrença e o ceticismo assumiram o poder. E se o resultado da Copa nos parece incerto, embora exista quem afirme o contrário, o resultado das urnas infelizmente chegará com o sabor da apatia e da incredulidade da existência de vitoriosos.
Enfim, todos juntos vamos, prá frente Brasil, Brasil, salve a seleção. A Copa chegou, mas não esqueçamos que a cozinha nos espera tão logo o evento termine.

Amargor



Chega um tempo em que os olhos acordam lívidos, frios, sólidos.
Somente enxergam o que enxergam. 
A pedra é uma pedra, a flor é uma flor, a semente, semente. 
Tempo de não querer colher, por não querer plantar.
De não querer vencer, por não querer lutar. 
Tempo em que se aceita a existência do imutável.
O peixe aceita o anzol, o cavalo o laço, o pulso, a algema. 
Tempo de emudecer, resignar, aquietar. 
Jogar a toalha, já que a seca chegou.
Aceitar a navalha, já que a dor se instalou. 
Um tempo cético. Um tempo ateu. 
Chega um tempo em que o próprio tempo diz 
Chega.