quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O que há por trás do Habib´s

Poços de Caldas tem “fome” de crescimento e a gastronomia aqui é prova incontestável disto. Nas ultimas semanas, somente a Avenida João Pinheiro- uma das principais artérias da cidade- recebeu dois novos locais (uma franquia de renome e uma bonita churrascaria) o que reflete os investimentos crescentes neste setor. Se olharmos para a área central e para os bairros é visível o número cada vez maior de restaurantes, bares, lanchonetes, carrinhos de lanches, tornando cada vez mais diversificado “o cardápio” oferecido pelo município aos seus cidadãos e turistas. Todo este movimento deixa feliz e orgulhoso todos aqueles que torcem pelo desenvolvimento da cidade. Assim, a chegada recente de uma franquia de renome nacional e também a nova churrascaria, só para citar dois exemplos, trazem, além do que foi citado, mais recursos aos cofres públicos e geração de emprego e renda para dezenas de famílias. Tudo isto motivo de comemoração e alegria: empresários acreditando no potencial da cidade, pessoas recebendo qualificação e emprego, mais recursos aos cofres públicos, cidadãos e turistas com novas opções de lazer e entretenimento.
Mas, afinal, pergunta- com toda razão- o impaciente leitor: o que há por trás do Habib´s?
Calma, não é o que parece. O que pretendemos chamar atenção com o título desta matéria é que bem ali, por trás da franquia de comida árabe, estamos perdendo um patrimônio histórico: a “estrada de ferro da Mogyana”.
Para contextualizar o problema, valho-me de informações prestadas pelo jornalista Rubens Caruso, através de um documento: o dossiê de tombamento do patrimônio ferroviário de Poços de Caldas, datado de 2003 amparado pela Lei Municipal 5.376, de 1993, que tombou o conjunto arquitetônico da Estação Ferroviária do Município.
A história conta. Em 1886, Dom Pedro II esteve em Poços de Caldas para inaugurar o Ramal de Caldas – uma extensão da linha férrea da Mogyana e “única forma de ligação entre o vilarejo e os centros urbanos”. Após a inauguração, o movimento de pessoas interessadas em aproveitar as belezas da recém criada estância hidromineral, valendo-se da “Maria Fumaça” cresceu muito. “A Estrada de Ferro Mogyana passou então por um período de grande prosperidade, pois suas composições partiam lotadas de Campinas para cá. Seus trens passaram a ser, durante várias décadas, o meio de transporte preferido pelos viajantes à região da Mantiqueira, até que o aparecimento das estradas de rodagem pavimentadas, permitindo um percurso mais rápido e confortável, diminuiu o movimento da tradicional ferrovia. No final da década de 1990 a estrada foi desativada, passando a funcionar apenas para cargas a partir da estação da Bauxita e seus trilhos foram retirados do centro da cidade por volta de 1998”. (www.memoriadepocos.com.br)
Hoje, o Brasil rediscute a importância das ferrovias para o desenvolvimento comercial e turístico da nação. Em Poços de Caldas, o tema patrimônio ferroviário vive um momento conflitante com o desenvolvimento da cidade, que fingimos não ver. É como se tivéssemos dois vagões em direções contrárias e o choque fosse inevitável. Mas, onde se encontram os “maquinistas”?
Não se discute que os empreendimentos trazem desenvolvimento ao município. Não se discute também a legalidade dos pontos comerciais que avançam hoje sobre o leito da ferrovia, pois, ao que nos parece, os proprietários adquiriram legalmente o direito de usufruir do espaço.
O que se deve refletir é como deixamos isto acontecer? De quem é a responsabilidade? Há condições de reverter este processo? Ou o melhor é esquecer a ferrovia e sepultar os trilhos da história?
Quando atentamos para um novo projeto da administração atual (muito louvável por sinal) de padronizar todos os carrinhos de lanches próximos ao parque José Affonso Junqueira, onde todos os boxes terão a imagem “de vagões de trens” refletimos: os vagões da gastronomia entrando em cena e os vagões da Mogyana sendo descarrilados.
Outra idéia, a de transformar o leito da ferrovia em uma avenida para desafogar o trânsito da João Pinheiro, foi descartada, até porque, o espaço físico impossibilitaria tal iniciativa.
Para finalizar, pois este texto já está maior que a malha ferroviária européia, o problema é escolher qual caminho queremos trilhar. Assim como o monotrilho, (olha o trilho aí de novo, gente), ou damos o assunto por encerrado e deixamos as linhas do trem ocupar apenas a nossa memória, ou, realmente encaramos o problema para a busca de soluções. O que não dá é falar de patrimônio histórico e não cuidarmos nem do patrimônio e muito menos da história.
Para encerrar, um provérbio árabe: “a árvore quando está sendo cortada, observa com tristeza que o cabo do machado é de madeira”.