quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Oh! Guarda-Chuva!


Dezembro é o mês das chuvas e ele sai apressado, por vezes, amassado, empoeirado, mineiramente esgalepado de dentro dos armários, dos guarda-trecos, por detrás das portas.  Ninguém se lembrava mais dele, porém, quando a chuva aparece, uma pergunta também volta a aparecer no cotidiano: “Alguém viu meu guarda-chuva?”. 
Tá certo que muita gente, geralmente mais idosa, o tenha como companheiro nos dias muito ensolarados, mas, geralmente é quando os pingos caem que os guarda-chuvas saem. Vale lembrar que o feminino do guarda-chuva é a sombrinha, ou, pelo menos, foi assim que aprendi. Alías, por uma educação machista bem do interior mesmo, ou sei lá o que, sempre evitei sair com sombrinha pelas ruas. Veja só que bobagem: prefiro ficar molhado dos pés à cabeça, do que ser visto andando com uma sombrinha pelas ruas.  Como diria Roberto Carlos e uma namoradinha de uma amiga minha, nem mesmo sei o que eles vão pensar de mim. Tenho ainda outras dúvidas sexuais pluviométricas: o guarda-chuva seria o marido da sombrinha? Ou seria um objeto andrógino ou hermafrodito? Será que é por isto que ele sai sempre do armário? O guarda-chuva fica molhado e a sombrinha molhadinha? Ops! Vou deixar pra esclarecer isto com a Laura Muller, antes que seja acusado, nos tempos atuais, de preconceito pluvial, digo, sexual.
Meninos e Meninas. Que fique claro como os dias de sol.  Não tem nada a ver (nem a chover) homem que sai com sombrinha ou mulher que sai com guarda-chuva.  É tudo uma questão de uma chuvinha por cima e, afinal, depois vem o arco-íris.  (Ops 2). (Contudo, me reservo no direito metereológico de me molhar dos pés à cabeça se não houver um guarda-chuva próximo…)
Enfim, enquanto muitos afirmam que a maior invenção de todos os tempos é a roda, ou mesmo o computador, penso que o guarda-chuva é que deve receber tal honraria.  Afinal, ele superou qualquer previsão do tempo, já que sua existência, dizem, remonta 3.400 anos atrás na Mesopotâmia e apesar de tanta evolução tecnológica, nunca foi substituído, nem ficou ultrapassado ou obsoleto.  Um acessório tão simples, utilizado por todo o mundo, das classes mais simples às mais sofisticadas, pelas mais diferentes culturas, sem que tenha sido criada coisa melhor ao longo de séculos, merece verdadeiramente todas as homenagens e pedidos de desculpas.
Oh! Guarda-chuva! (e Sombrinha também!).

Perdoe-nos por tantas vezes que nos esquecemos de você. Ou quando, depois de usá-lo, nem lembramos mais da sua existência e voltamos a lhe esquecer literalmente em tantos lugares. Que você continue a nos manter secos, em meio a tantos molhados, ou mesmo protegidos do calor infernal, com o perdão atemporal de São Pedro.  Amém!

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Redes (de esgoto) Sociais


A idiotice, a canalhice, a maledicência, a calúnia, a falta de caráter, para citar apenas alguns indícios da ausência de lastro moral da humanidade, ganharam nos tempos atuais um aliado importante: as tão decantadas redes sociais, representadas por emails, facebooks, twitter,  blogs, etc. A possibilidade do anonimato, de se esconder atrás de um perfil fake ( falso), faz com que milhares de  indivíduos, (ou seria melhor,  de bandidos), utilizem o espaço dito democrático, (neste caso vem mais do demo mesmo), para vomitar seus inconfessáveis e escusos objetivos. O lixo acumulado na mente de determinadas espécies humanas encontra nas redes sociais o local ideal para o despejo do seu esgoto de caráter.
A internet que deveria ser (e em milhões de exemplos realmente é) um imenso espaço de socialização do conhecimento acaba, muitas vezes, por se transformar em um ringue virtual,  MMA cibernético cujas Mentiras e Maldades Apócrifas destroem, por linhas inconseqüentes, a imagem de pessoas e instituições. Quem cai na rede, descobre muitas vezes, que por lá não existem peixinhos de aquário, mas cobras peçonhentas buscando destilar seu veneno em um imenso Butantã.
Basta um ser demente que mente inescrupulosamente em frente a uma tela quente escrevendo coisas que arquitetou maquiavelicamente para se ter o resultado de tudo isto descaradamente na nossa frente: vivemos realmente em um mundo doente.
Sabe-se que não é por falta de cultura e sim por excesso de impostura.
Sabe-se que não é uma questão de idade e sim por questão de impunidade.
Sabe-se que não é pelo fator social e sim por ausência absoluta do fator moral.
Some-se a isto, a consciência de que a dita mídia tradicional, aquela que como a internet também é global, concede, por vezes, sustentação, guarita e amparo, à podridão humana na divulgação irresponsável e leviana dos guinchos dos ratos do porão.  
Triste mundo imundo do submundo das redes (de esgoto) sociais - emissário atual das mais diferentes doenças patogênicas do ser humano, como a cólera, a inveja, o orgulho, a vaidade...
O esgoto destilado no céu aberto das redes contamina diariamente milhões de pessoas em todo o planeta, sem tratamento, sem saneamento.

Até quando?

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Conversando com o tempo



Ufa! Estamos chegando ao final de mais um ano. A razão nos sinaliza que se trata apenas de uma mudança de número na folhinha, mas a emoção nos recorda a necessidade de um balanço. Débitos e créditos e o saldo para o início de uma nova etapa. Daí, o tempo, sempre ele, é régua a definir nossa passagem pela Terra na trilogia cronológica do passado, presente e futuro. E a nossa conversa então se inicia. 
Ah, o passado. Ele é a sentença proferida que não nos permite correções ortográficas. Não dá para apagá-lo, modificá-lo, ou deletá-lo. Ele é que delata os erros e acertos de nossas escolhas, que estarão lá, indelevelmente gravadas em nossa memória. O passado vive a lembrar que está vivo em uma simples ruga, nas rusgas que a vida deixou. É o registro que, invariavelmente consultamos, mesmo que não tenhamos consciência. De repente, eis que surge das profundezas onde parecia inativo, e, reaparece na superfície, sólido, concreto, e se revela em um simples gesto nosso, uma pequena frase, um sorriso, mostrando que verdadeiramente permanece presente em nós. O passado não passa incólume. Ele deixa rastros, vestígios, marcas, zombando do presente e do futuro dizendo: Vocês não existem! Serão sempre simples conseqüências do que deixei. Heranças do que construí. Dizem que eu fui, mas verdadeiramente eu sou a realidade que pode ser mensurada, analisada, refletida, aprendida. Os outros, presente e futuro, são meras invenções sem produtos tangíveis, ilusões criadas para tentar apagar minhas pegadas e a minha real preponderância sobre o tempo. 
Assim, por vezes, tentamos esquecer o passado e negar sua existência, nos abraçando ao presente.
Ah, o presente. Dizem que o melhor da vida é viver o presente, mas, como, se quando achamos que vamos aproveitá-lo, ele já passou? Se, ao identificarmos sua existência, ele já inexiste? O presente que nunca se deixa desembrulhar, que é constante movimento, e tem no gerúndio seu sinônimo. O presente, por sua vez, diz ao passado e ao futuro. Passado, você está morto. É mera página virada, estrada já percorrida que não permite retorno. E você, futuro, nem existe, está sempre na possibilidade e nunca sequer foi visto. E ambos são resultados de todas as minhas ações. Sem mim, nenhum de vocês existiria. Eu sou o agora, a vida em movimento, a possibilidade da transformação e da mudança. É só imaginar que se cada ser humano fizesse o melhor no meu tempo, ninguém gostaria de lhe esquecer, passado, e você, futuro, seria realmente aquela luz viva a esperar a minha chegada. 
Mas como tentamos apagar o passado e o presente já passou, o futuro nos seduz. 
Ah, o futuro. Estamos sempre a colocar nossas moedas em seu bolso. Na maioria das vezes, imaginamos que tudo será melhor quando ele chegar e lhe criamos outro nomes, como sonhos, projetos, ideais, esperanças. Ele nunca chega talvez pelo simples fato de nos impulsionar para a continuidade, a nos lembrar que não existe linha de chegada, pois todo momento é uma nova partida. O futuro, por sua vez, questiona o passado e o presente: Estou sempre à sua frente, passado, representando o que há de vir. Você deita sobre o que fez, eu estou sempre acordado e sou o único que representa verdadeiramente o tempo que nunca morre. E você, presente, tem inveja e vive querendo ser o que sou. Você é uma pequena cópia minha, o futuro imediato. Eu sou sem amarras, sem início e sem fim, sou o eterno. Sou o que nunca chega, embora todos anunciem a minha chegada. 
Um novo ciclo está chegando e na régua do tempo, entre o passado, o presente e o futuro, vale recordar que não somos nós que passamos pelo tempo. Ele é que passa por nós. Assim, não é ele que traduz quem somos se crianças, jovens, adultos ou idosos. Somos nós que mostramos a ele verdadeiramente o que somos: seres imortais na indissolubilidade do cosmos.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Vistas grossas


Não se sabe se é algo patológico, genético, ou mesmo congênito. O que se sabe é que, ao longo dos anos, se transformou em uma epidemia de graves conseqüências no Brasil. O problema começa com um desvio quase imperceptível do globo ocular, posteriormente vai se agravando até comprometer toda a visão. Embora não seja descrito na oftalmologia, o problema da “vistas grossas” atinge cada vez mais, um número maior de brasileiros, notadamente àqueles que estão na administração pública, em suas mais diferentes esferas.
Sabe aquilo que muita gente vê, sabe que está errado, mas, finge que não vê, pois pra “resolvê” vai dar muito trabalho e, se for “candidatável”, nem voto vai gerar?
Com certeza, todo mundo conhece ao menos um exemplo desta insuficiência ocular e administrativa em qualquer cidade deste país. Responda aí: quantos anos você ouve falar de uma situação na área da saúde, da educação, da segurança, que necessita de solução? Contudo, o tempo passa, o tempo voa e a problemática sem a “solucionática” continua. Pelo contrário, quando o problema se agrava, gera muitos outros como a “miopia” de prioridades, o “glaucoma” da impunidade, a “catarata” de desmandos.
Será que existe tratamento, um remédio eficaz, um procedimento cirúrgico, ou a situação é irreversível?  Olha, do jeito que as coisas andam embaçadas, não dá para ver nenhuma solução para a tal doença, que se espalhou e se tornou crônica pelas administrações públicas do país.
A esperança é que algum homem de visão possa criar uma lente corretiva, ao menos para minimizar tal situação, ou mesmo, óculos especiais que possam livrar o povo de tanta armação.

Por último, a certeza que este artigo, como muitos sobre o mesmo tema, não irá mudar absolutamente nada. Sabe por quê?  Os que realmente precisariam ler e refletir sobre este assunto irão, com certeza e mais uma vez, fazer “vistas grossas”...

domingo, 1 de dezembro de 2013

Janelas Quebradas


Tenho andado pelas ruas de Poços. As mesmas que há anos circulam em mim, pois, nascido aqui, não deixo de me encantar diariamente com muitas que cortam o município.
 Não dá para ficar indiferente, por exemplo, à Assis Figueiredo. Uma das principais artérias da cidade, que no trafegar frenético de carros e pedestres, é símbolo do desenvolvimento de nossa gente. Na Assis, as vitrines de lojas cada vez mais modernas refletem o passo apressado de pessoas que anos atrás, não tinham pressa nenhuma. Difícil não se deslumbrar com a Rua São Paulo, que no trecho até a Praça Pedro Sanches, apresenta o desfile de árvores fícus como guardas da rainha a levar turistas e cidadãos até o Monumento Minas ao Brasil. As mesmas árvores que no período do Natal se transformam em maravilhosos lustres para receber o ser mais ilustre que já passou pela Terra. (Será que elas se vestirão assim este ano?).
Como não aspirar poesia ao caminhar pela Rua Padre Henry Mothon no caminho entre a Praça do Museu e a Igreja São Domingos? Como não sentir a magia da Avenida João Pinheiro a ligar o centro da cidade até os bairros? E a Champagnat... a Doutor David Benedito Otoni?
Mas, se reconhecemos a beleza de nossas vias, impossível desconhecer que muitas delas, estão sujas, com calçadas de pisos irregulares, cheias de buracos, além de serem palco de vendas de bugigangas e crescente número de pedintes.
As causas são inúmeras, entre elas, a falta de cultura, de civilidade, de cidadania, de centenas de pessoas que despejam nas ruas, o “lixo” existente nas suas cabeças. É o papel de bala, o toco do cigarro, o chiclete mastigado, a latinha de cerveja, é o resto de sorvete, é o fim do caminho.
Por outro lado, a morosidade da ação pública na fiscalização e combate às pequenas ações que com o tempo resultam em grandes e graves conseqüências. As ruas centrais estão se transformando em verdadeiras feiras livres, onde tudo é permitido. Em nome da “liberdade individual” nos tornamos reféns do que é ilegal, imoral e prejudicial à saúde do município em todos os sentidos: econômico, turístico, social,  ambiental etc. São atitudes criminosas que merecem atitudes punitivas.
Aqui cabe recordar da Teoria das Janelas Quebradas, que estabelece, entre outras análises, que uma simples janela quebrada de uma residência, se não reparada, poderá gerar outras janelas destruídas e a partir daí, a invasão da casa por vândalos, o tráfico de drogas, a criminalidade. “Se uma comunidade exibe sinais de deterioração, e esse fato parece não importar a ninguém, isso fatalmente será fator de geração de conflitos”.
Portanto, cabe a cada um, cuidar das suas “próprias janelas” e à administração pública, preservar as “janelas” do município, fiscalizando e punindo todo aquele que pensa que a rua é o prolongamento do quintal da sua casa, podendo fazer o que bem entende, pois conta com o (des) amparo público.

As janelas (ruas) da cidade, não podem, de maneira alguma, se tornarem portas abertas para os que não têm nenhum compromisso com esta maravilhosa “residência coletiva” denominada Poços de Caldas. 

domingo, 24 de novembro de 2013

Presos



Acompanhamos as prisões dos condenados no processo do “Mensalão”. Entre muitas reflexões em um país onde a dúvida sobrepõe-se a qualquer certeza, onde fazer o que é certo, nem sempre dá certo, onde o erro muitas vezes é até enaltecido e valorizado, temos que, acima da insanidade que acometem os fanáticos, refletir que a Justiça como pilar de sustentação de um país, deve ser sempre soberana.
Pode-se até discordar de uma sentença judicial, mas o que não se pode aceitar é que, em nome de corporativismos partidários ou pessoais, haja a tentativa de desmoralizar ou descaracterizar o que foi sentenciado pelos tribunais. É de se estranhar, se não de causar estarrecimento, que aqueles que alegam terem sidos no decorrer de suas histórias políticas, detentores da moralidade, da honestidade e da legalidade, de um momento para outro, busquem agora, quando a Justiça não lhes favorece, desqualificar a ação judiciária se auto intitulando como presos políticos, bodes expiatórios ou qualquer outro eufemismo.
Se ao povo, no momento do voto, cabe o julgamento de um político, é nesta mesma régua, sob o mesmo diapasão, nesta mesma ótica, é que cabe à Justiça em seus preceitos legais, determinar o veredicto sobre as ações de todo homem público no exercício de sua função ou mandato. Aqui não estamos falando de Josés ou Joãos, de siglas partidárias de direita ou esquerda, de governo ou de oposição. Estamos nos referindo à impunidade, que somada à corrupção generalizada, são os principais males que afetam a nossa sociedade.
 Tentar jogar a população contra a Justiça é ato que deve ser refutado por todos os que desejam realmente ver esta nação mais fortalecida na credibilidade de suas instituições.
No caso citado no início deste artigo, foram anos de discussões e investigações, milhares de páginas analisadas, centenas de horas dos mais importantes juristas deste país nas suas mais diversas instâncias para se chegar ao veredicto. Os réus tiveram ao seu lado, o acompanhamento técnico de seus advogados, no direito democrático de defesa.  Neste sentido, cabe lembrar que democracia é um sistema de governo, respaldado principalmente pela legalidade das ações e não pelo que determinado grupo, a seu bel prazer, considera certo ou errado. Democracia é a proposta que vem consolidar a convivência entre os opostos e acatar, não aquilo que privilegia interesses particulares, mas o que tenha como norte o interesse público.
 Se os condenados querem verdadeiramente fortalecer a sua dignidade, que ajam condignamente.
 Ano last but not least, please, não se declarem vítimas, nem heróis, nem perseguidos pela ditadura, muito menos mártires.
De verdade e infelizmente, presos estamos todos nós brasileiros, nesta cadeia de corruptos que de forma endêmica atingiu a todos os setores desta nação acorrentada por anos de desmandos e mazelas.


terça-feira, 5 de novembro de 2013

Alô, é do 141?


Dizem que o mundo é feito de coincidências. Pode ser. Dizem que os números têm sempre uma resposta. Pode ser. O fato é que ao pensar sobre os 141 anos de Poços de Caldas me lembrei que, coincidentemente ou não, 141 é o telefone do Centro de Valorização da Vida- um local onde um grupo de voluntários recebe ligações de todo o país de gente que necessita de ajuda ou simplesmente quer fazer um desabafo. Bingo! Há males que vem para bens, refleti.  Imaginei que o “meu parabéns pra você pra Poços” seria uma ligação para o 141 que aconteceria mais ou menos assim:
- Alô, é do 141? Queria falar sobre Poços... posso?
- Me desculpe senhor, mas não estou entendendo. O senhor chegou ao fundo do poço e está precisando de ajuda, é isto?
- Não, exatamente. Aí não é do Centro de Valorização da Qualidade de Vida? Pois, então, eu gostaria de fazer um desabafo sobre a qualidade de vida de Poços de Caldas que está completando 141 anos...
- Olha, meu senhor, o 141 é um telefone para que as pessoas reencontrem a felicidade e entendam que a vida se faz no presente...
- Muito bem lembrado. Poços é verdadeiramente uma feliz cidade, porém, o que preocupa não é tão somente o presente, e sim, o futuro.
- -Mas, ouvi dizer que Poços de Caldas é uma cidade muito bonita. Andei de bodinho e de bondinho aí quando eu era criança. Poços, a terra da saúde e da beleza!
- É verdade. Porém, a gente se encantou por demais com as nossas decantadas belezas que a saúde ficou um pouco no desencanto.
- Mas me lembro que a cidade era muito tranqüila, muito segura...
- É, ou era. Já não falamos mais com tanta segurança sobre isto. O que preocupa é a sensação da cidade estar crescendo, porém, sem saber como, onde e nem por quê. A percepção é que não temos uma bússola a indicar se estamos realmente no caminho certo. Estamos no Sul, sem um norte.
- O senhor está me parecendo muito ansioso, está precisando relaxar um pouco...
- Relaxamento.  Talvez seja esta a palavra. Verdadeiramente relaxamos em muitos pontos importantes, improvisamos por demais e, hoje, pagamos um preço alto pelo “fazejamento” sem o devido planejamento. 
 - Olha, sinceramente, não sei como ajudá-lo. O senhor me parece muito impaciente...
- Impaciente? Penso é que estamos virando pacientes. Verdadeiros “tubos de ensaio” para experiências das administrações que se sucedem no poder.
- O senhor precisa ter calma, sair um pouco. Que tal dar uma voltinha de carro com a família...
- Nem me fale nisto. O trânsito aqui se complica a cada dia. O único lugar que tenho quase certeza de achar uma vaga para estacionar é no meu prédio e olha lá...
- Bem, o senhor me desculpe, mas, tenho muitos outros “incêndios mais sérios para apagar” e vou ter que desligar.
- É isto!  O senhor acaba de me dar uma grande ideia.
- Pera  aí.  Não entendi.
- O senhor disse “apagando incêndio” e resumiu com propriedade o que tem acontecido em Poços nos últimos anos: estamos “apagando incêndios” na cidade das águas...
- Mas, e daí?
- Ué, vou ligar agora mesmo para o 193. Quem sabe eles não encontram uma saída... nem que for  a de emergência.


segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O país dos mascarados


Assistimos nos recentes movimentos sociais, a presença do Black Bloc – grupo de pessoas que se veste usualmente de preto, com máscaras ou faixas cobrindo os rostos e que parece ter  um único objetivo: atacar de maneira agressiva os bancos, indústrias ou qualquer “alvo capitalista” como eles mesmos afirmam.  Na verdade, o Black Bloc existe há décadas em todo o mundo e no Brasil, segundo se apurou, pasmem meus senhores e senhoras, existem vários grupos, sendo o maior, o Black Block  Brasil com 35 mil seguidores e o Black Bloc-Rio de Janeiro com quase 20 mil membros. Para a maioria da população são apenas vândalos, arruaceiros, rebeldes sem causa que se aproveitam dos movimentos sociais, para promover quebra-quebra.  Porém, segundo declaração a imprensa dos próprios membros do grupo, o Black Bloc  tem objetivo bem definido na luta contra tudo o que representa o abuso capitalista. As máscaras, afirmam, são usadas para não serem perseguidos pelos policiais e evitar ainda a projeção de algum líder para o movimento. Ao vermos membros do Black Bloc quebrando o que encontram pela frente, utilizando-se de máscaras para preservar o anonimato, nos permitimos ir além, na analogia da existência no Brasil, de centenas de mascarados que destroem lares, patrimônios e vidas e se escondem, por assim dizer, no anonimato e na impunidade. 
Quantos motoristas estão mascarados por detrás dos volantes, fazendo barbaridades nas ruas e estradas deste país, matando milhares de pessoas durante o ano?
Quantos policiais se valem da farda para disfarçar o banditismo na violência extrema, no tráfico de armas e drogas?
Quantos empresários estão por trás dos colarinhos brancos pagando propinas, sonegando impostos, contrabandeando produtos?
Quantos comerciantes se valem dos seus estabelecimentos para enganar os consumidores, no abuso excessivo de preços, na comercialização de produtos vencidos, no acréscimo de centavos imperceptíveis no check out?
Quantos políticos se travestem nos seus ternos engomados e sapatos polidos de homens sérios e comprometidos com o povo, para obterem vantagens pessoais através de comissões ilícitas,  de mensalões, nos acordos fraudulentos de gabinetes, no tráfico de influencia, usando e abusando da máscara da autoridade?
Perguntamos, além do Black block, quantos mascarados existem neste país em instituições da mais alta credibilidade,  extorquindo, manipulando, seqüestrando, destruindo famílias, pessoas e bens?
“Brasil, mostra tua cara, quero ver quem paga, pra gente ficar assim” (Cazuza

domingo, 8 de setembro de 2013

Brasil não rima com céu de anil


  1. Nós, brasileiros, nos acostumamos a falar sobre o assunto “guerra” analisando conflitos existentes em outras nações. Vemos pelas imagens da TV e da Internet, por fotos nos jornais e nas revistas, as guerras em curso na Síria, no Afeganistão, no Paquistão, em Israel, no Iraque, para citar algumas. Conforme fomos culturalmente “adestrados” pelos filmes de Hollywood, guerra de verdade envolve tanques nas ruas e bombordeios por céu e mar. No Brasil, não. Afinal, moramos em um país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza e que beleza, pois em fevereiro tem carnaval!
  2. Decididamente, acreditávamos: Brasil não rima com fuzil.
  3. Discutimos a violência crescente no país. A violência contra a mulher, contra a criança, a violência das ruas e a dos lares, a das drogas e a dos bares. Aquela que se espalha pelas escolas, trafega por todas as classes sociais, invade grandes e pequenas cidades e nos coloca em prisão domiciliar. A violência do traficante e da polícia, a do condenado e a do juiz, a do motorista e a do pedestre, a do patrão e a do empregado. A violência que se mascara nas ações dos políticos corruptos e aquela que se delata anônimamente na anarquia do Black Bloc nas recentes manifestações sociais.  Buscamos encontrar as causas que nos trazem a grave consequência: mais de 110 mil pessoas mortas por ano no Brasil. Somente no trânsito são mais de 50 mil.
  4. Decididamente, percebemos: Brasil não rima com mãe gentil.
  5. Como resgatar o bandido, se as prisões lotadas são hoje universidades do crime? Como acreditar na polícia, se muitos políciais se diferem apenas na farda em relação aos ditos criminosos? Como apostar na justiça se ela é tão tardia quanto falha? Como crer nas Igrejas, se muitas se tornaram apenas pontos de comercialização da fé? Como acreditar nos políticos se muitos sequestram a nossa esperança, estupram nossa bandeira, assassinam o nosso direito a um país melhor?
  6. Decididamente e infelizmente, refletimos: Brasil não rima com céu de anil. 

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

O cafezinho


Encontro com amigos pela cidade. Entre um café e outro, bate papo rápido sobre assuntos do cotidiano. Maior correria, não dá parar, correndo atrás, expressões comuns nos dias atuais. A conversa então segue para questões triviais: o tempo cada vez mais curto, o dinheiro sempre no limite, os times cada vez mais sem futebol e as reclamações sobre governos e políticos, ou a falta de governo e a ausência de bons políticos. Na maioria das vezes, embora ninguém comente, a sensação é que estamos falando sobre as mesmas coisas há tantos anos, discutindo tantas doenças incuráveis, como um disco de vinil riscado tocando o mesmo trecho de uma canção em uma velha vitrola. 
Por ser jornalista, sou cobrado pela falta de cobrança dos meios de comunicação em relação às atitudes dos políticos. A ideia de muitos é que a imprensa tem influência para cobrar e que o poder do jornalista, seja no jornal, no rádio, na TV e hoje na internet, pode provocar as mudanças que a sociedade exige. Argumento então, que a maioria dos jornalistas está também correndo atrás do prejuízo, buscando sobreviver em um mercado cada vez mais estreito, onde os meios de comunicação tentam alternativas para não fecharem suas redações, não calarem seus microfones, não desligarem suas câmeras. A maioria dos jornalistas está na pressa, na prensa e na inadimplência. Isto porque as empresas jornalísticas não descobriram ainda como vender um produto como a informação, que hoje é oferecida gratuitamente nas redes sociais, no facebook, nos blogs, na convergência digital da Internet. 
Além disso- continuo filosofando - a democratização cibernética possibilitou o aumento geométrico, quantitativo mesmo, no número de informações. O acesso a tudo e a todos, em todos os momentos, nos legou a overdose no processo informativo. Ironicamente, pela possibilidade digitalizada de saber tudo, percebe-se que muita gente não quer saber de nada. O excesso de informação está nos conduzindo à desinformação, assim como na fotografia, quando o excesso de luz deixa a foto “estourada” ou provoca a “cegueira” do retratado. 
O papel da imprensa-continuo “viajando”- sempre discutido, de transformar a sociedade acabou por ser diluído, pois, em todo momento, um novo fato acontece, uma nova situação se apresenta e se faz necessário informar a todos em tempo real sobre tudo o que acontece no mundo. O novo então toma o lugar do que existia há alguns segundos atrás, resultando na dispersão, na dissociação e em uma imagem difusa da realidade. Ninguém sabe realmente as respostas e por isto estamos perdendo também a capacidade e o desejo de formular perguntas. 
A rodinha dos amigos no café então se dispersa. Sinto que o meu papo, “empapuçou” e o relógio volta a nos cobrar atitudes. Cada um retorna então ao seu próprio mundo: o trabalho, a família, os estudos, as contas pra pagar... eta vidinha!
Quem sabe, nos encontraremos em breve para um rápido bate papo, e, entre um cafezinho e outro, discutiremos sobre o tempo cada vez mais curto, o dinheiro sempre no limite, os times cada vez mais sem futebol e as reclamações sobre governos e políticos. 
Reflito que apenas uma coisa poderá sofrer alguma mudança: o preço do cafezinho.

domingo, 18 de agosto de 2013

A doença crônica de uma política anacrônica


Existe algo de extremamente nocivo na Política já há muito comentado e que não se altera ao longo do tempo. Não raro ouvimos discursos inflamados com palavras infeccionadas pela retórica com um único objetivo: a permanência quer seja de um indivíduo ou de partidos nas esferas públicas. Assim, a busca não é, como ainda nos tentam convencer, de alcançar as melhorias na sociedade através dos aparelhos governamentais, mas tão somente ficar, permanecer, continuar a exercer o poder, arquitetando maquiavelicamente os meios para que isto se concretize. Um destes, o tráfico de influência. Fulano conhece beltrano que conhece sicrano e, por intermédio desta quadrilha, cargos são ocupados, leis são aprovadas ou reprovadas, benefícios são repartidos entre amigos, e o poder continua a ser exercido, não em nome do povo, mas em nome de um grupo, quer seja ele político ou empresarial.  Assim, o voto nas urnas acontece apenas para validar um sistema que tem em sua formação, o conluio, as tramas, o jogo de cartas marcadas, que ocorreu muito tempo antes, nos corredores dos palácios, nos gabinetes políticos e nos escritórios das empresas. 
A eleição, denominada eufemisticamente de livre e democrática, é o ato final, o palco teatral para que os atores representem e a plateia valide a atuação. O voto é tão somente o ingresso ou o reingresso do político ao poder. Até as manifestações nas ruas são utilizadas como bandeira por aqueles que tentam ludibriar a população se autodenominando defensores dos interesses públicos.
A maioria dos cidadãos já não se sente mais representado, muito menos respeitado, quer seja por políticos, partidos ou instituições. Há certa descrença coletiva inoculada nas veias dos cidadãos que não creem mais na transfusão das suas necessidades para as veias daqueles que deveriam representá-lo.
Ironicamente e antropofagicamente, o desejo e a busca insana pelo poder tiraram do político aquilo que deveria ser a essência de sua missão: ser o representante legítimo do cidadão e não aquele que está no cargo apenas para representar os sórdidos interesses particulares, empresariais ou partidários.

Difícil enxergar cura, quando a doença é crônica nesta política anacrônica.  
Difícil enxergar tratamento eficaz para o mal causado por anos de corrupção e impunidade. 
Difícil enxergar luz, após anos vividos na escuridão do poder. 

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Oração ao homem público


Que todo homem público saiba honrar sua função na compreensão de que o poder é passageiro e fugaz, mas que uma única atitude sua pode ser permanente e prejudicar milhares ou milhões de pessoas por dezenas ou centenas de anos;

Que todo homem público possa discernir a diferença entre o poder da comunicação e a comunicação do poder para que a humildade seja sempre sua bussola orientando o norte a seguir;

Que todo homem público carregue em seus olhos, as lágrimas das pessoas mais simples, das vidas mais simples, para que a sua visão não se embace pelas névoas da vaidade e o sorriso enganador da fama;

Que todo homem público não se vanglorie nas vitórias, não se encante com as glórias, nem se perturbe pelo esquecimento, no entendimento de que nenhuma placa de homenagem ou discurso de reconhecimento pode substituir a alegria da missão cumprida;

Que todo homem público não seja apenas o gerúndio da intenção, mas o imperativo da ação no comprometimento com as necessidades prioritárias notadamente dos que mais dependem das ações públicas;

Que todo homem público ao tomar suas decisões tenha a inteligência que lhe possibilita a razão, sem olvidar da sensibilidade que antecede a tudo o que permeia o humano;

Que todo homem público não use a retórica para alcançar a subserviência do outro, não se comprometa com o que não possa cumprir, perceba a transparência como um dever e a dignidade como direito de todos;

Que todo homem público, enfim, tenha espelhado na mesa de seu gabinete, o pó das ruas sem asfalto, o sangue dos bairros sem saúde, o quadro negro das crianças sem escola, para que a sua caneta carregue sempre as tintas da integridade e da luta contra as injustiças sociais.


 Assim seja.

domingo, 11 de agosto de 2013

Amigos por nada


Sou como milhões: conheço centenas de pessoas, converso habitualmente com dezenas delas e tenho poucos muito amigos. 
Sim, porque amizade não é uma questão quantitativa, nem pode ser.  Ninguém tem centena de amigos. A maioria conta seus amigos pelos dedos das mãos. Só Roberto Carlos é que, em uma antiga canção, afirmava querer ter um milhão de amigos... que comprassem seus discos e acabou conseguindo.
Amigo de verdade não tem a ver com querer. Se alguém disser “quero ser seu amigo”, pronto, acabou a amizade, até porque cheira falsidade. Amizade não é algo que se escolhe, não tem a ver com desejo, não exige esforço, nem experiência.  Não exige currículo, carta de apresentação, nem bons antecedentes.
Os amigos que tenho foram frutos de encontros fortuitos e que, sabe-se lá porque, continuaram fazendo parte da minha existência ao longo do tempo. Tornamo-nos amigos realmente sem querer.
Não conheço ninguém que possua uma “caderneta de amigos” e, por favor, não me venham com esta história de amigos virtuais. Não desqualifiquem a palavra. Amigo é quem compartilhou com a gente, em corpo presente, alegrias e tristezas. Aquele que sabe da nossa história, que conhece o espelho de nossa alma e frequenta nosso coração. Derramou lágrimas ao nosso lado sem dizer uma única palavra e gargalhou junto por uma piada infame até ficar com dor no pescoço. Existe coisa mais irônica do que ler no alto da página no Facebook: “Ajude fulano a encontrar os amigos dele”. Coitado do cara. Cadê os amigos dele que o deixaram sozinho?
Amigo mesmo até se esquece da data do nosso aniversário, mas lembra sempre de torcer diariamente para que a gente seja feliz. Não precisa estar geograficamente próximo, pois amigo de verdade reside permanentemente no quarto das nossas lembranças, no sótão das nossas memórias.  Não precisa telefonar para gente sempre, pois sabe que a ligação é permanente. Amigos nunca vão embora, pois a proximidade não é física.
Amizade lembra algo genético, sem ser familiar. Parece muito com transfusão, mas não tem nada a ver com laços sanguíneos.
Os amigos que tenho são pessoas fantásticas e, por isto mesmo, possuem muitos defeitos. Um deles é o mesmo meu: na maioria das vezes eles não dizem para mim os defeitos que tenho. Não é falta de sinceridade. Amigo não precisa ser sempre sincero, nem ser sempre mentiroso. Não precisa declarar que gosta da gente. Não necessita testemunhar, nem provar sua amizade.
A amizade não precisa de justificativas.

A gente é amigo por tudo e apesar de nada. 

domingo, 7 de julho de 2013

O BRASIL NA UTI



Há tempos vivemos um Brasil doente. Anos de corrupção generalizada, desmandos, impunidades, licitações ilícitas, superfaturamentos, jeitinhos, falcatruas, incompetências, nepotismos, desvio de verbas resultaram na falência múltipla dos órgãos públicos, partidos políticos, instituições governamentais e não governamentais, dezenas de empresas públicas e privadas e veículos de comunicação.  
As recentes crises econômicas nos Estados Unidos e na Europa maquiaram a nossa realidade. O brasileiro comum teve acesso aos eletrodomésticos, ao primeiro carro, ao apartamento nos conjuntos habitacionais. Assistimos a ascensão da classe C e foi possível viajar de avião para o exterior. Parecíamos saudáveis.
Contudo, a facilidade de consumo apenas camuflava a metástase que se espalhava por todo o organismo social.  Aos poucos, os sintomas foram aparecendo: inadimplência em alta, criminalidade sem controle e a inflação refletida nas etiquetas dos produtos nos supermercados mostraram enfim, nossa verdadeira cara. “Brasil mostra tua cara quero ver quem paga pra gente ficar assim”. (Brasil – Cazuza)
As tentativas de manter o país em tratamento paliativo somente comprovaram que remédios caseiros como Bolsas e Cotas têm prazo de validade. Verdadeiros placebos governamentais que colocam o paciente por mais tempo vivo em respiração artificial.  
O país necessitava de algo mais forte que pudesse amenizar aquela dor civil que, embora dissimulada, nos tornava amorfos, anêmicos, apáticos e depressivos.
Foi aí então que algo aconteceu. Assim como uma simples faísca pode detonar um barril de pólvora, redescobrimos que éramos cidadãos e não consumidores e que havia um lugar para ser a vitrine do nosso descontentamento coletivo contra a política de gabinetes: as ruas, praças, avenidas e rodovias. Um pequeno riacho então se avolumou e se transformou em um tsunami de cidadania. Milhões de pessoas saindo de suas casas pelas mais diversas causas, gritando o seu não conformismo, incomodados com a acomodação das nossas autoridades. Faixas e cartazes utilizavam frases imperativas de ordem como “Desculpe o transtorno. Estamos mudando o Brasil”. A nação vivendo a indignação na primeira dose de quimioterapia social, depois de anos de silêncio de uma ditadura partidária que também se travestiu de democracia para se autodenominar a voz do povo.  Mas não foi sem dor. Atos de vandalismo, tentativas de apropriação partidária dos movimentos, perdas de vidas humanas e prejuízos financeiros nos ensinaram que nos processos de cura há contraindicações.
Apesar de tudo que estamos vendo e vivendo, importante lembrar que não estamos curados. Os movimentos sociais enfrentam uma doença degenerativa que há dezenas de anos comprometem o funcionamento do corpo social. Necessário fortalecer nosso sistema imunológico contra os vírus, bactérias e parasitas que há anos estão impedindo nossas melhorias. Necessário continuar com o tratamento intensivo, eliminando células malignas que insistem em destruir as esperanças de um Brasil mais vivo, mais forte e mais livre.
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia, você vai ter que ver a manhã renascer e esbanjar poesia”. (Chico Buarque -Apesar de você)


domingo, 16 de junho de 2013

Dona Luisa e a sacola


Eu devia ter uns seis anos e Dona Luisa, com a sacola nos braços, passava lá em casa e minha mãe dava a ela alguns “mantimentos”.
Vivíamos a década de 1960: os Beatles na vitrola, o surgimento da música de protesto, o homem pisando pela primeira vez na lua e a informática dando seus primeiros passos. No Brasil, a inauguração de Brasília, a renúncia de Janio Quadros e o início da ditadura que durou mais de 20 anos. Na música, o iê-iê-iê, o Clube da Esquina, a Bossa Nova e a Jovem Guarda revolucionavam os hábitos e costumes da juventude. Acreditávamos que a liberdade era uma calça velha azul e desbotada e a bolsa jeans nos traria a paz e o amor tão sonhados.
Chegamos ao início do terceiro milênio e a folhinha marca o ano 2013.
Vivemos no Brasil de hoje, a era da “ditalula”, o sertanejo universitário e suas onomatopeias, o face com pouco book, a miséria nas ruas, as drogas nas ruas, a violência nas ruas, o medo nas ruas... e as famílias aprisionadas em suas casas.
O governo implantando por decreto a justiça social através das Bolsas e das cotas. Feliz e livre é aquele brasileiro que tem eletrodomésticos em casa, um carrinho na garagem e vários carnês para pagar. Fizeram-nos acreditar que o ter nos faz iguais no ser.
Mas, voltando a falar sobre Dona Luisa, quase 50 anos se passaram e dois anos atrás a vi, com o rosto já traçado pelas ruas do tempo e do sofrimento, sacola a tiracolo, recebendo ainda os mantimentos das mãos de minha mãe. Mais recentemente soube que Dona Luisa não estava passando mais por lá.  Indaguei, preocupado: - Ela está doente? Responderam-me: - Não. É que a Dona Luisa já não precisa mais dos mantimentos da sua mãe. Ela agora recebe o “Bolsa Família”. 
Dona Luisa talvez nem saiba. Mas ela continua ainda com a sacola nas mãos, tendo mudado apenas o local de retirar o seu mantimento. A liberdade, já se sabe, não se faz pelo bolso, muito menos pelas Bolsas. Ela tem seu pilar de sustentação em uma educação sólida, na geração de oportunidades de trabalho e quando, pelo suor do seu rosto, o cidadão constrói seu próprio sustento.
A melhor maneira de ajudar o outro é dar a ele a possibilidade de nunca mais necessitar de ajuda. Tudo o mais é escravidão.


domingo, 12 de maio de 2013

MÃEEEEEE!



Quando chegamos e abrimos pela primeira vez os nossos olhos, ela está lá a nos receber com o sorriso mais sincero e o abraço mais forte que veríamos em nossas vidas.  Naquele momento, embora não compreendamos o significado das palavras, a nossa sabedoria de criança entende os gestos e as expressões dela a nos dizer: “Eu te amo. Você é a pessoa mais importante do mundo”.  É o nosso primeiro encontro com a palavra “amor”, que, tempo depois, quando a maturidade nos aproxima do real significado das coisas, compreendemos que “amor” é o sinônimo mais completo para a palavra “mamãe”.
Após o nosso nascimento, dias ou meses depois, aquela palavra de apenas cinco letras, é a primeira que pronunciamos e que, por milhares de vezes, voltaríamos a repeti-la.
O certo é que a palavra ”mamãe”, balbuciada em nossos primeiros dias, passa por mudanças no decorrer de nossas vidas. Na juventude, a vida nos convida a viver as ruas e nossa pressa reduz as palavras. “Mamãe” perde então algumas letras e vira apenas “mãe”.  É sintomático: ao aceitar o convite do que é passageiro, perdemos a compreensão do que é eterno.  Como não temos tempo a perder, perdemos o tempo de conviver com quem mais nos dedica seu tempo. Não importa: ela continua lá, a orar em nossas despedidas, a esperar pelo nosso retorno.
Os dias passam e viramos adultos. O trabalho nos consome, a responsabilidades nos suga, construímos nossa família. Mãe então passa a ser aquela que gera nossos próprios filhos.  Daí então, quem nos gerou passa a ser chamada de “mãezinha”, ou mesma de “vó”, já que os cabelos brancos a identificam nas fotos com os netos.  Neste período já não frequentamos mais a casa da “vó”. Ah, sim, nos finais de semana, passamos por lá para um almoço breve, ou então, no Dia das Mães, cumprimos a agenda, ao levar flores e aquele abraço rápido.  Ás vezes, quando nos sobra tempo, um telefonema rápido buscando saber rapidamente que, claro, está tudo bem com ela. Sim, notamos: ela já não é mais a mesma. Os seus passos estão mais lentos e a dificuldade para nos ouvir, por vezes, nos deixa impacientes.  Contudo, embora a vida dela esteja mais lenta, ela continua ali, na cadeira da “vó”, a fazer seu tricô e a nos esperar para aquele abraço rápido, o sorriso rápido, a conversa rápida.
O tempo, sempre ele, avança como o vento e varre a vida. Ficamos velhos e contabilizamos as ausências.
Olhamos para um álbum de retratos e lá está ela com o seu sorriso de mamãe, seu carinho de mãe, seu olhar de mãezinha e a sua sabedoria de vó.
Neste instante, ao tentar conter as lágrimas, no mais profundo de nosso coração, uma voz explode, ecoa e suplica ao universo:
 “Mãeeeeeeeee!”

sábado, 4 de maio de 2013

FORA DE MODA



Não sei você, mas, ultimamente, ando me sentindo como um par de galochas competindo com as botas de ultima geração de uma moderna sapataria. Literalmente estou fora de moda e nem protesto já que minhas atitudes me condenam.
Ainda falo “bença mãe!” e faço nome do pai em frente à igreja. Muito embora a pressão social e industrial seja forte, sou convicto de que mulher é mulher, homem é homem e paca é paca, ou pelo menos eram. Peço licença para passar entre as pessoas e o volume do som do meu carro serve apenas à minha audição. Ainda busco uma lixeira para jogar o papel e quando vejo alguém jogando uma latinha na rua, quase me mordo de vontade de jogar a pessoa no lixo. Quanto estou sentado e vejo uma gestante em pé, fico incomodado até oferecer o lugar. Continuo dizendo com muita frequência “por favor “ e “obrigado” e, ao conhecer alguém , me pego dizendo “muito prazer em conhecê-lo”. Ainda me espanto, de um lado, com o comportamento dos políticos e de outro, com a passividade do brasileiro. Fico indignado no descaso do patrão com o empregado e o descaso do empregado com a empresa. Incomoda-me a tecnologia sem limites sendo mais valorizada que o humano e o comportamento sem limites dos que se dizem defensores da liberdade.
Verdadeiramente sou peça fora de catálogo, àquela ceroula branca competindo com os pijamas de grife.
Meus olhos ainda teimam em lacrimejar ao ver o cuidado de uma enfermeira com a paciente idosa. O sorriso aberto de um motorista de ônibus em meio ao trânsito insuportável. As mãos grossas de um jardineiro podando os espinhos de uma rosa e a professora de braços abertos recebendo as crianças na porta da creche.
Ainda leio poesia ao cair da noite. “Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, perdeste o senso. E eu vos direi, no entanto, que, para ouvi-las, muitas vezes, desperto e abro as janelas, pálido de espanto.” (Olavo Bilac).
 Sou gravata borboleta em um sofisticado closet e decididamente as roupas deste mundo moderno não servem em mim.
Tudo bem. Sempre detestei uniforme.  

quinta-feira, 28 de março de 2013

Felizes para sempre


Ao longo da vida conhecemos vários casais que estão juntos há 10, 20, 30 anos ou mais. Vivenciando longas-metragens ao invés de seguirem os curtas tão em moda nos dias atuais. E se perguntarmos a cada um como fizeram para permanecer juntos, apesar das diferenças, apesar dos problemas, apesar das discussões e dos conflitos, apesar do crescimento no número de separações, não iremos encontrar uma resposta única. Sim, porque existe um tempero próprio, um modo de fazer à moda da casa que resultou na cumplicidade, em um partilhar e compartilhar. A persistência venceu os problemas, a vontade de ficar junto venceu o cansaço.  O insistir venceu o desistir. Mas claro, não foi sem trabalho, não foi sem esforço. Porque amar também dá trabalho, exige paciência, requer cuidados e determinação. Não dá para dizer eu te amo e achar que tudo termina ali. Pelo contrário, tudo começa ali.
Dias atrás ouvimos uma pessoa afirmar que um relacionamento a dois só dá certo nas telas do cinema. Ousamos discordar. Conhecemos casais que estão juntos pela  aliança mútua de um compromisso firmado baseado em um roteiro de respeito e fidelidade. Casal perfeito? Longe disso, pois se reconhecem como humanos. Mas se esforçam diariamente para manter viva a chama em um universo onde tudo leva à descrença, à individualidade, ao egoísmo.
O monólogo, por vezes, é mais fácil. Ser o personagem principal sem precisar dividir as cenas, encanta e seduz. Por isto não são poucos os que pensam em viver tão somente o verão do encontro e paradoxalmente congelar os momentos felizes.  Sem receitas prontas, para vivenciar um verdadeiro filme de amor é essencial reconhecer que o inverno vai chegar e poderá fazer tremer o relacionamento. Por vezes, o outono fará cair às folhas. Contudo, insiste a esperança  que,, na sequência das cenas,  o calor voltará a aquecer os dias e os frutos virão ainda mais fortes.
Por tudo, ao receber um convite de casamento percebemos não ser um ato individual. É a oportunidade coletiva de renovar nossas crenças nas histórias de amor que acontecem diariamente na vida real por mais que nos pareça o contrário. 
O “Felizes para sempre” enfim, pode não ser apenas o título de filme romântico em cartaz nas telas de cinema. Pode ser realidade em plena luz do dia em uma segunda feira.  Basta querer e desejar profundo. Basta “seguir o roteiro” como, lá de cima, nos ensina o diretor. 

domingo, 10 de março de 2013

Fim da picada



Existem pequenas coisas que fazem parte da nossa vida há centenas, talvez milhares de anos, e que, compulsoriamente aprendemos a conviver, por mais que aquilo nos incomode. São coisinhas miúdas que talvez não merecessem estas linhas, mas hoje, não sei se por falta de assunto (ou porque o assunto em si me incomodou durante toda a noite) que resolvi logo de manhã redigir um pequeno texto, no tamanho da coisa. Inicialmente devo declarar que, ao longo dos anos, dei literalmente meu sangue para o assunto, prioritariamente ao sexo feminino, mesmo que contra a minha vontade. Em razão disso, imaginei um título para um filme do Zé do Caixão: “Só as fêmeas bebem nosso sangue”. Por outro lado, o esquerdo do cérebro lembrou-me do escritor polonês Kafka em “A Metaformose” e fiz um trocadilho infame (qual não é?) com “qué ficá”, um jeito mineiro de dizer que a coisa quer ficar vampirescamente ao nosso lado noite e dia. Nesta transfusão, o meu amigo “Gugol” revela a existência da probóscide (como é que vivi tantos anos sem esta informação?)- arma letal que perfura a pele e que contem substâncias anestésicas e anticoagulantes. Um verdadeiro exterminador do passado, presente e do futuro.
Embora a coisa ataque o nosso sistema nervoso, é preciso reconhecer sua biotecnologia: um sistema perfeito de canais internos faz o sangue circular livremente (o dele e principalmente, o nosso) e outro duto reaproveita 90% da água das fezes, algo que as cidades brasileiras deveriam aprender para melhorar o saneamento básico.
Mas o que mais chama a atenção, até porque sonoro (e também nos tira o sono) é a eficiência aerodinâmica (ou seria hemodinâmica?) das suas asas (azar o nosso). Durante o voo, as patas dianteiras ficam encolhidas e as traseiras são alongadas para trás e as turbinas são acionadas pelas asas em até 300 batidas por segundo. As patas longilíneas e leves auxiliam na aterrissagem. “Atenção senhores passageiros! Em poucos segundos, estaremos pousando na pele daquele cara ali. A hemobrás avisa e ANVISA: o sangue é nosso!”.
Você deve estar pensando: É o fim da picada, alguém perder tempo em escrever sobre isto. Também acho este texto, chato, cricri e pernilongo.  Mas espere um pouco.  Acabei de perceber um culex quinquefasciatus rondando minha cabeça. Agora ele, melhor dizendo, ela está na parede do quarto. Sangue do meu sangue. Vai ser um tapa só... é agora...Pá! 
- Ué, cadê o bicho?

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Não se fazem mais carnavais como futuramente


Vamos despir a fantasia: o carnaval de ontem, o do corso e das marchinhas,o das bisnagas inofensivas, de confetes e serpentinas, Pierrôs e Colombinas, só existe na memória emocional de quem passou dos 40. Certo, vivemos a moda do retrô e tentamos retroceder no tempo para tentar eternizar a “inocência” dos carnavais de outrora.

Ô abre alas que o passado quer passar. O carnaval do presente é o carnval do passado. Tudo muito válido, pois desejamos verdadeiramente reviver a Máscara Negra que nos transformava em mais de mil palhaços no salão. É como se olhássemos um álbum de fotografias e buscássemos repetir no presente o que um flash fotográfico registrou. Os vovôs de hoje arrastam os pés e levantam os polegares buscando que a animação não seja desanimada. Os jovens tentando achar no axé aquela magia que os vovôs vivem dizendo. Mamãe eu quero...um carnaval como o do meu avô. Almejamos o ontem, nos dias de hoje. “Vovô Ampulheteiro” foi a composição (ou decomposição) vencedora do ultimo Concurso Nacional de Marchinhas da TV Globo, versão (ou inversão) da “Pipa do Vovô”, hit dos anos 1970.

Sim, a gente continua Sassaricando nos salões e Maria Sapatão ainda convive com os arlequins, mas o carnaval de outrora foi um rio que passou e as águas estão rolando de maneira diferente. Se você fosse sincera, Aurora, admitiria que não dá mesmo para que isto ocorra. Já não somos os mesmos, o mundo mudou. A passarela do samba foi invadida pelo capital na Festa do interior. Taí: os abadás substituíram as fantasias, os patrocinadores são os destaques na avenida e os camarotes são locais disputados por aqueles que desejam os holofotes da fama. Até a quarta feira de cinzas já não traz a tristeza dos dias de outrora. Pelo contrário, ela nos reacende a chama da busca pelo material, pois, decididamente, não se vive de alegorias e adereços.

Definitivamente, não se fazem mais carnavais como antigamente, e por mais que cantemos marchinhas, o universo mudou a marcha. Ficamos mais rápidos e a alegria é um produto que se vende em embalagens diferentes durante o ano todo e em fevereiro tem carnaval.

Em todo este cenário, só nos resta uma certeza: o Me dá um dinheiro aí, continuará sendo sucesso no enredo dos carnavais do século XXI.

“Confete, pedacinho colorido de saudade, ao te ver na fantasia que usei, confete, confesso que chorei”.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Santa Maria rogai por nós


A tragédia na cidade de Santa Maria (RS) ocupa os espaços da mídia e das reflexões do cotidiano. Se a dor dos familiares é infinita, o assunto poderá ser mais um com tempo de duração previsto para “enquanto for notícia” e daqui a pouco contabilizado nas estatísticas das “fatalidades” ocorridas no país ao longo de sua história. Hoje procuramos os culpados, amanhã somos todos inocentes. Hoje discutimos sobre alvarás, responsabilidades, desrespeito, necessidade de maior fiscalização. Amanhã, colocaremos nossos crachás de pacatos cidadãos e correremos novamente atrás da falta de dinheiro que é fatal.

Por enquanto, estamos assim, buscando o conforto na espiritualidade e sentindo o desconforto da realidade. Entre o abraço possível da solidariedade e a impossibilidade das soluções. Entre a potência do divino que habita em nós e a prepotência do humano que insiste em nos rodear.

Contudo existe sempre um pouco de Fênix em cada brasileiro e quem sabe o renascer não esteja próximo? Quem sabe a cidade de Santa Maria seja, nas cinzas, a verdadeira divisora das águas?

Quem sabe a cidade de Santa Maria, seja a redentora das nossas crenças e com a morte de seus filhos, interceda por nós para o nascimento de uma nova nação?

Quem sabe a cidade de Santa Maria possa rogar por todos nós brasileiros contra a emissão dos gases tóxicos da corrupção e dos desmandos que há tempos inalamos e nos retire da nossa omissão e daqueles que nos representam?

Quem sabe a cidade de Santa Maria que hoje está de luto, não nos motive à luta por um Brasil muito melhor?

Assim seja. Santa Maria rogai por nós.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Agora e daqui a pouco


Ela promete o prazer, a felicidade permanente, o êxtase, o encontro com os deuses, à liberdade. Ela encanta os incautos, inebria os entediados, seduz inocentes. Ela diz expandir a consciência, eternizar a sensibilidade, realizar os desejos impossíveis. Ela está ali na esquina, frequenta as escolas, se diverte nas baladas. Mas pode ser encontrada também em consultórios e escritórios, nas portas das empresas, no trafegar das rodovias, na orla das praias, nos bairros mais ricos, nas palafitas e favelas. Encontra-se disponível à luz do dia e na negritude da noite, 24 horas por dia. Pode se vestir de terno e fraque ou até de camiseta e bermuda. É percebida no olhar de um adulto, mas já se encontra também disfarçada no sorriso de uma criança. Sua chegada é comemorada com fogos e euforia e a sua amizade pode ser para sempre.

Ela sequestra os sonhos, aprisiona os sentidos, rasga os contratos, ceifa os laços da amizade. Ela enfraquece os órgãos, apodrece os membros, desconfigura os sentidos, envelhece a face. Acorrenta a liberdade, desilude a vontade, assassina o amor. Ela perturba a paz, macula a fé, apaga a esperança. Adoece as famílias, invade os quartos das clínicas, ocupa as celas, preenche as valas dos cemitérios. Inocula as veias e contamina o sangue. Inala as narinas e retira o ar. Compartilha o cérebro e deleta a consciência. Ela é doença crônica do corpo e da alma, a solidão do cosmos, a ferida que nunca se fecha, a tristeza do adeus, a ausência da poesia, o desafinar dos instrumentos, o choro incontido, o desespero da dor, o tsunami social.

Agora, o prazer, a liberdade, saúde e vida.

Daqui a pouco, a dor, a prisão, doença e morte.

Droga- o agora nunca vale pelo daqui a pouco.

 

sábado, 5 de janeiro de 2013

Muito além do jardim

O prefeito Eloísio Lourenço terá muitos desafios pela frente na administração municipal, o que não o difere de outros que o antecederam. O maior deles, talvez, será o de atender às expectativas: do partido que ele representa, dos eleitores que votaram nele, daqueles que não votaram, mas se declararam felizes com sua vitória, dos que dizem serem “Eloísio desde criancinha”, dos que afirmam que o “coronelismo agora acabou” ou simplesmente dos que somente querem uma “vaguinha” no seu governo. Em razão de tantas esperanças, a cobrança será grande e o início da sua administração na escolha do seu secretariado parece, de maneira geral, ter agradado. Mas, a aliança com partidos que lhe eram adversários durante a campanha eleitoral, gerou descontentamento em muitos eleitores. “Política é sempre assim, é tudo farinha do mesmo saco”, afirmam os descontentes. “Não dá para governar sozinho” disse o prefeito na convicção de que os fins justificam os meios. O certo é que o “purismo” que caracterizou a vitória de Eloísio já sofreu seu primeiro impacto provocando certo desencanto naqueles que acreditaram no bordão da sua campanha que pregou “a verdadeira mudança”.

Muita hora nesta calma. Como disse o escritor John Wilmot, “antes de casar, eu tinha três teorias sobre educar crianças, agora tenho três crianças e nenhuma teoria”. Assim, para analisar com maior profundidade a “gestação” do novo governo é necessário aguardar o desenvolvimento das “crianças”.

Embora nada tenha sido informado até o momento pela equipe de transição, já se sabe que o prefeito terá uma primeira tarefa: equilibrar as contas da prefeitura. Diga-se de passagem, (de ano), isto não é novidade pra ninguém, e também não é, diga-se de passagem, (de comando), um privilégio nosso, pois a quase totalidade dos municípios brasileiros passa pelo mesmo problema.

Outras questões talvez sejam mais específicas e irão exigir muito da nova administração: como manter a coalizão política enfrentando as inevitáveis colisões partidárias? Como elaborar o necessário planejamento de governo e simultaneamente o “fazejamento” necessário para a concretização de obras e ações? Como combinar o conhecimento acadêmico com as práticas gerenciais em uma prefeitura com dezenas de setores e milhares de servidores? Como mudar um sistema que foi se perpetuando ao longo dos anos para o bem e para o mal e efetivar a necessária modernização da máquina pública?

São inúmeros os questionamentos e o tempo, sempre ele, é que trará as respostas. Porem, pelo que temos acompanhado nas administrações que se sucederam, cabe importante reflexão que não se refere apenas ao novo governo municipal. É urgente, prioritário, fundamental, a reflexão sobre o futuro da cidade. Não dá mais para administrar enxergando apenas o tempo presente, colocando a cidade como refém de ações improvisadas que comprometem os anos vindouros. Para isto, necessário sair da “beleza” das flores e ir muito além do jardim.

Ao longo do tempo, ficamos tão encantados olhando para o espelho, admirando as nossas belezas naturais, que não cuidamos dos “espinhos” em razão de um crescimento desordenado. Necessitamos agora de “jardineiros” quem possam pensar hoje o que queremos para o amanhã. Isto significa analisar e valorizar o passado, diagnosticar o tempo presente e projetar o futuro na consciência de que “só e possível compreender a vida olhando-se para trás, mas só é possível vivê-la, olhando-se para frente”.

A você, Poços, felizes anos novos!

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

PASSAGEM

Não sei você, mas a passagem de ano, sempre me incomoda. Depois até me ajeito na poltrona, me acomodo, me sossego. Mas, a intersecção entre o velho e novo, me parece exigir novas atitudes, novos olhares, novas formas de fazer e me relacionar com coisas e pessoas. O ano velho falando tchau e o outro chegando, batendo na porta, exigindo o novo, de novo. É um cobrador de ônibus solicitando o ticket e questionando. “E aí, vai ficar nesta sua vidinha besta? Trabalhando, estudando, fazendo compra no supermercado, assistindo futebol na TV, pegando filme na locadora, saindo com o cachorro, discutindo a relação...”. A sensação é a de estar em uma rodoviária, cheio de malas e pertences antigos embarcando em nova viagem rumo a um destino que desconheço, ou mesmo que conheço por demais e, exatamente por isto, a palavra mudança chega sempre no imperativo.


Que tal um corpinho novo? Entre em uma academia, faça musculação, olha a dieta, não se esqueça da caminhada, beba com moderação, restrinja a ingestão de alimentos gordurosos, frutas e legumes sempre. “Por que tudo que eu gosto é ilegal, imoral ou engorda?”. Claro, tem homem fazendo botox, cirurgia plástica, implante de cabelo. (Não sei. Já sou um semi-novo com pneu meia vida e motor recondicionado. Não se muda por fora, o que por dentro já se consolidou. Vou esperar a viagem seguir mais a frente).

Que tal uma mudança de emprego? Largue tudo o que está fazendo hoje e seja um empreendedor. Monte um boteco, uma pizzaria. Tecnologia é o que manda. Invista em um site de compras coletivas. Vai vender hardware, software, tupperware. Seja mais radical ainda. Mude de cidade, largue as montanhas e vá viver em uma cidade praiana. Tire o sapato e a gravata. Coloque um chinelo e um calção, vá vender coco e comida natural. Largue o consumismo e seja adepto do zen budismo, do bermudismo. Monte uma pousada em uma praia de nudismo. (Sei não. Quem me garante que não vou nadar, nadar, e morrer na praia? Não sou muito chegado ao sol e ficar passando protetor solar e repelente não é algo que me cheira bem. Vou esperar a viagem seguir mais a frente).

Que tal um novo amor? Uma linda mulher em um último tango em Paris ou mesmo em um lugar chamado Nothing Hill? Um Titanic de paixão, antes do amanhecer? Que tal virar um Shakespeare apaixonado sob as pontes de Madison, como se fosse à primeira vez? (Não sei. Já sei letra e música e as 10 coisas que minha mulher odeia em mim e acredito que sempre alguém tem que ceder mesmo. As lendas da paixão tendem a durar pouco, no máximo, nove meses. Vou esperar a viagem seguir mais a frente).

Enfim, não vejo à hora de terminar o mês de janeiro, quando o ano novo já começa a ficar velho. Mudanças? Vou esperar até o final de ano, quem sabe...