sexta-feira, 27 de abril de 2012

Brincando de Estátua

Se pudesse brincaria de estátua com o tempo e congelaria alguns momentos para que permanecessem eternos. O sono interminável na cama simples de lençóis brancos da casa bordada de azulejos, de alpendres amigos, de janelas de madeira azuis e trincos abertos e, o silêncio da noite interrompido apenas pelos grilos falantes e a melodia dos pingos de chuva nas telhas de barro. O primeiro olhar no grupo escolar para a menina de saia azul rodada, de olhos pretos, de “Maria Chiquinha” nos cabelos loiros, minha primeira e insubstituível esperança de um virar dois. O futebol nos campinhos de terra com a bola de capotão e nas tardes de chuva, as roupas, canelas, braços, pernas, faces, olhos e cabelos, limpos pela lama da infância. As conversas inconseqüentes nas calçadas- quando a cidade ainda era um bairro só- sem a pauta da TV, da amizade sentada em cadeiras de pau e como testemunhas, a praça da matriz, o pipoqueiro e as ruas largas de pedras irmãs. O grito do carteiro comunicando a chegada daquela carta- quando o tempo ainda demorava a chegar- com o envelope cheirando goma arábica e a letra manuscrita de quem escrevia seu nome na minha história. O abraço imenso e apertado de minha mãe quando na adolescência parti em busca dos meus sonhos. E o retorno tão aguardado das férias, do ônibus parando na esquina e aquele sorriso que nunca partiu a me acolher novamente. Os almoços intermináveis de família -quando a comida ainda não era o prato principal-temperados com muita prosa e o sabor dos risos das pessoas que se sabiam eternamente próximas. Se pudesse brincaria de estátua com o tempo.Mas ele,o tempo, se mexe a todo o instante.Pena.O tempo não sabe brincar.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Recursos desumanos e departamentos impessoais

Os nomes foram mudando ao longo do tempo e a identificação do setor foi ganhando mais status: Departamento Pessoal, Recursos Humanos, Gestão de Pessoas. A estrutura também passou a ter mais equipamentos, informatização, mais gente trabalhando e a inclusão de outras ciências como a psicologia. O processo de seleção ganhou mais cientificidade e a entrevista para a escolha do profissional adequado se compara hoje a uma dissertação de mestrado. Tudo para que o setor tenha competência em escolher pessoas certas para os lugares certos. Isto, claro, quando a opção não é buscar empresa especializada para exercer esta atividade. Apesar de todo este cenário que nos motiva a pensar nos excelentes resultados obtidos, há que se refletir sobre um problema recorrente quer seja em empresa pública ou privada: muito de máquinas e regras, pouco de humano e expressivo. O tecnicismo, os resultados estatísticos, o ativo e o passivo no balanço patrimonial são utilizados como objetivos prioritários e o hardware e software assumem mais importância que o humanware. Dirão que isto é antigo, foi descrito no marxismo e, ao longo da história, por cientistas sociais e teóricos da administração. Conseqüência da competitividade de mercado, do capitalismo selvagem, da luta de classes, da globalização, do mundo virtual. Usamos o raciocínio por demais e perdemos a intuição. Descobrimos as causas das coisas para aceitar passivamente o problema. Dirão que tudo é natural, não é. Dirão que faz parte, não faz. É necessário recordar permanentemente que somos veias e sangue, para não fortalecermos apenas os dutos e os óleos. Não esquecer que muito além do trabalhador e de sua função na empresa, existe alguém que sente, sorri, se encanta e cria. Que trabalha a dor e a alegria, que sonha e realiza, se emociona e faz pulsar. Dirão que é romantismo e que o “sistema é bruto”, estratégia de quem busca validar a violência. O universo é complexo, múltiplo e contraditório. Neste cenário de dúvidas e incertezas, cresce a responsabilidade das lideranças nas empresas públicas e privadas. Infelizmente, o ambiente é paradoxal. Procuramos por líderes empresariais e o mercado nos oferece patrões. Carecemos de gestores públicos e recebemos apenas currículos de políticos profissionais. Neste clima, onde o oásis imaginário esconde o deserto, observamos o modismo dos treinamentos e cursos de qualificação que não tem alterado o figurino: a maioria dos cursos não tem a presença dos lideres, pois estes “têm coisas mais importantes para fazer”. A consequência é matemática: líderes despreparados gerenciando subordinados mais qualificados e o denominador comum é a insatisfação nas relações. Gente reclamando de gente desde o chão de fábrica até as salas grandes e suntuosas da presidência. Operários falando mal do patrão e o patronato insatisfeito pela “incompetência” dos empregados. Embora a comunicação interna seja também outro instrumento up to date, a “rádio peão” ganha a cada dia maior audiência nas organizações. O empreendedorismo tão propagado, muitas vezes é mais fuga, um grito de liberdade, a carta de alforria para quem se julga preso às correntes de uma empresa, sob o jugo de um patrão. Para todo este quadro, não existe, claro, uma única solução, dado à complexidade do problema e à multiplicidade organizacional. Contudo, sejamos redundantes: o comandante é quem comanda o destino da embarcação. Ele precisa estar preparado não somente no necessário auxílio dos instrumentos de navegação, mas na habilidade de relacionamento com toda a tripulação. E tal como nas empresas, se os recursos forem desumanos e os departamentos impessoais, o naufrágio é certo.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

O futebol nasceu realmente em 1912

Antes de mais nada quero esclarecer que não sou fanático. Claro, tenho várias camisas do time na minha gaveta e carrego na carteira, um distintivo do clube. Também não perco um jogo, quer seja pelo rádio ou pela TV e fico triste ou alegre dependendo do placar. Sim, toda notícia que fala sobre o time não deixo de acompanhar. Obviamente também sei de cor o hino do clube e de vez em quando me pego cantarolando “agora quem dá bola é o...” Tenho também um livro que fala das conquistas do time e até hoje reclamo o roubo de um livro intitulado “O Álbum de Ouro” que contava tudo sobre o clube desde o início da sua fundação até os anos 1970, se me recordo bem. Também não sou de discutir futebol com os meus amigos, pois, em minha modesta opinião (me permitam agora dizer o nome do time), o Santos “não entra em campo, ele dá espetáculo”.
Por que sou santista? Não posso dizer que foi genético. Meu pai era Fluminense e “tirou o time de campo” em sua separação conjugal, pouco antes do meu nascimento. (Edson era antes do nascimento, depois virou Pelé, hehe). Os meus irmãos torciam e se retorcem até os dias atuais pelo Vasco da Gama, ou seja, são “vascaindos”, ops, vascaínos. Também não posso dizer que foi influência de amigos, já que desde os meus cinco anos de idade eu já era “apeixonado” pelo Peixe. Muitos dizem que na verdade eu sou é “viúva do Pelé”.
Tudo isto não tem a mínima importância, já que não existem mesmo explicações lógicas para a gente torcer por um time. Futebol é como religião, onde a fé se mistura com a paixão, inflama a emoção e o brasão do time se torna um manto sagrado. Não é por acaso que muitos times têm nomes sacros, como o São Paulo, Santo André, São Caetano, Santarritense. Eu dei sorte por torcer para um que engloba todos os santos e faz milagres com a bola nos pés. Fazer o que?
Enfim, quis o “deustino” que eu me tornasse fiel torcedor do alvinegro praiano desde menino. E o ser santista possui muitas características que a razão desconhece. Uma delas é que a grande maioria dos santistas nunca foi à cidade de Santos e nem sequer conhece a Vila Belmiro, a “mais famosa do mundo”. Alguns nunca viram o mar, embora para a gente, Netuno hoje é o Neymar e Ganso é o “cisne” do futebol brasileiro. Mais: 99,9% dos santistas também não tiveram o privilégio de ver o Pelé em campo, a não ser nas reprises da TV ou em filmes sobre o ex-jogador. Comentam ainda, não sem razão, que a torcida jovem do Santos é formada majoritariamente por “jovens” com mais de 50 anos de idade.
Por não ser um torcedor destes malucos que existem por aí, não vou ficar aqui registrando os inúmeros campeonatos conquistados pelo Peixe. Sinceramente não é objetivo dizer da simplicidade que sentimos perante os inúmeros títulos durante estes 100 anos de vida. Para nós santistas, isto é mera estatística. O que mais nos encanta é o futebol arte, aquele do drible, do passe perfeito, da falta bem cobrada e que teve e tem no Santos, ao longo de sua história, os mais legítimos representantes. Embora nem me lembre muito bem, pois não sou de ficar acompanhando muito de perto, vou apenas citar alguns gênios, quer dizer, jogadores: Coutinho, Pelé, Pepe, Geovanni, Pita, Ailton Lira, Robinho, Diego, Neymar, Ganso.
Como toda pessoa que tem na humildade seu principal atributo, quero finalmente esclarecer que não é verdade que o futebol surgiu na Inglaterra em 1863. Segundo especialistas, o esporte surgiu verdadeiramente em 1912 no Brasil, em uma cidade do litoral do estado de São Paulo em um time que não me recordo o nome, mas prometo irei pesquisar, ressaltando, mais uma vez, que nem sou muito ligado em futebol. “Agora quem dá bola é o ...”

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Chatice

- Sei. Você não quer ouvir falar de política, nem de políticos. Prefere manter-se afastado de tudo o que se refere ao prefeito, vereadores, deputados e senadores.
- É tudo farinha do mesmo saco. Só querem saber do poder. Estão mais interessados nos seus altos salários do que se preocuparem com a população.
- Sei. Mas o que dizer da existência de bons políticos, pessoas realmente interessadas no bem estar da coletividade, que lutam pelos interesses dos mais necessitados?
- Deve realmente existir esse político, porém, só no início de mandato. Logo ele se deixa contaminar pelos “tomates podres” e tem que entrar no jogo para ver aprovada as suas propostas. Se ele não aceitar fazer acordos, não negociar, é carta fora do baralho.
- Sei. Mas você tem acompanhado as ações dos políticos que votou nas últimas eleições?
- Eu não. Nem me lembro do meu voto. Tenho coisas mais importantes para fazer. Preciso trabalhar duro ao invés de ficar vendo essa politicagem. É muita corrupção, interesses pessoais. Quer saber? Se for para falar de política, melhor mudar de assunto.
- Sei. Mas (insisto) são os políticos, os responsáveis pelas leis municipais, os que determinam os rumos da cidade e do país. A definição do salário mínimo, só para citar um exemplo, depende de decisão política.
- É verdade. Mas, estou cansado de ver a falta de vergonha, os desmandos, o dinheiro do povo sendo mal aplicado. Hoje falam mal um do outro, amanhã estão abraçados como se nada tivesse acontecido
- Sei. Mas se você concorda que a gente depende da política e ela vai muito mal, eu lhe pergunto: como mudar a política? Este ano teremos eleições municipais e daí, como ficam as coisas?
-Nem estou pensando na eleição. Na hora eu vejo. Escolho o menos ruim ou voto em branco...anulo o voto, sei lá. Quanto a mudar a política, isto não é problema meu. Já tenho os meus próprios pepinos.
-Sei. Mas você acha que as coisas irão mudar com você agindo assim? Será que a política não muda, porque a gente é que continua a não se interessar pela política e aí tudo fica do mesmo jeito? Será que não está faltando é agir diferente. Discutir cada vez mais, cobrar cada vez mais, exigir cada vez mais dos nossos representantes?
- Cara, como você tá chato hoje. Se não vai mesmo mudar de assunto? Vamos falar de futebol. Como é que vai o seu Santos?
- Acredito que está indo bem. Penso que a política do atual presidente do Santos, o Luiz Alvaro, de investir nos talentos do time e de segurar os melhores atletas, através de investimentos publicitários está dando certo e isto é bom para o futebol brasileiro. Por falar nisto, como você acha que ficará a política do futebol canarinho com a saída do Ricardo Teixeira da CBF?

(Você nem responde. Sei. Estou muito chato).

quarta-feira, 4 de abril de 2012

O que a gente mais faz, ninguém nos ensinou a fazer

Aprendemos muita coisa durante a vida: que a Terra é redonda, qual a velocidade da luz, os planetas do nosso Sistema Solar, sobre a falange, a falangina e a falangeta. Das estrelas ao GPS, dos hieróglifos à linguagem cibernética, do tronco de cone às células tronco. É fato. Sabemos hoje cada vez mais sobre como todas as coisas funcionam. Basta apenas um clique para termos acesso a todo o conhecimento que a humanidade gerou ao longo de milênios. Navegamos, compartilhamos, curtimos e comentamos. O mundo é plano e o nosso vizinho é um chinês que mora ao lado de um norte americano e este último em frente a um africano. As fronteiras se extinguiram e os muros foram derrubados. As ciências avançam nos seus estudos e a cada dia surgem novos aparelhos, novos instrumentos, programas e soluções para os mais diversos problemas da humanidade.
Contudo, ressalvadas às crenças religiosas, ainda não sabemos de onde viemos, porque estamos aqui e para onde iremos. Além disso, e apesar das inovações tecnológicas na medicina, não sabemos tudo sobre o funcionamento do nosso corpo (cada ser é único) e a neurociência ainda tem muito a descobrir sobre o cérebro- esta máquina perfeita que subutilizamos durante nossa passagem sobre a Terra. Estamos no facebook, no celular, nas redes sociais e o virtual ocupa todos os espaços. Mas perante tudo que o nos rodeia, ainda nos deparamos com problemas seculares do cotidiano: violência, desajustes familiares, conflitos emocionais, incompreensão, insatisfação, desilusão. Temos carências, sentimos falta de um abraço, de um toque, do reconhecimento, de um simples sorriso e as lágrimas teimam em cair de nossas faces em momentos de dor ou de alegria. Ainda somos os mesmos e o sangue ainda é da mesma cor de outrora. Precisamos do outro para sobreviver, nos compreender e validar nossa existência. Precisamos cultivar e manter relacionamentos reais. Desejamos ouvir e falar, gritar e aplaudir, cantar e pedir. Mostrar através das nossas múltiplas expressões e de todos os nossos sentidos que estamos vivos. Todavia, para tudo isto, ninguém nunca nos ensinou de verdade. Nos bancos das escolas ainda falamos de corpos discentes e docentes e não de corpos que sentem. Ainda ressaltamos a importância do saber da ciência, quando nem temos consciência sobre nós mesmos. E por não nos conhecermos, inventamos alguém que não somos e passamos ao longo da vida procurando quem somos no outro, este que também se desconhece. Aquilo que mais fazemos , nos relacionar e conviver com as pessoas, ninguém nos ensinou a fazer. Vamos aprendendo ou não nos erros e acertos, aos trancos e barrancos, buscando nas cicatrizes as causas dos nossos ferimentos.
A educação deixou de ser revolucionária e se tornou apenas espelho da sociedade, refletindo suas mazelas e descaminhos. Então, por que não revolucionar a educação? Antes de ensinar o ser humano a raciocinar, ou mesmo simultaneamente, ensiná-lo a cuidar das suas emoções no impacto com o relacionamento com os da mesma espécie. Quem sabe, experimentar, além das disciplinas da grade curricular, outras que agradem ou que abracem o nosso sentir? Que tal: História da Vida, Geografia dos Sentidos, Matemática das Relações , Física das Sensações, Linguagem do Amor?
Quem sabe, a partir destes outros saberes, possamos melhorar a nossa comunicação intrapessoal, nos preparando e nos sensibilizando para a comunicação interpessoal. Quem sabe, poderemos não só assimilar, mas vivenciar aquilo que tantas vezes escutamos e que mais deveríamos fazer na simplicidade do existir: amar ao próximo como a nós mesmos e ao Pai sobre todas as coisas.
Façam suas matrículas! Inscrevam-se já!
O universo é a nossa sala de aula e a vida, a nossa mais importante matéria.