segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Sujeito: sempre antes do objeto

A educação é um dos caminhos, não o único, para mudar o universo das pessoas e, por conseqüência, de uma cidade, um país. Seguindo o que disse mestre Paulo Freire (1921-1997), “a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda”.
Como professor, busco aprender no contato com alunos e docentes em um curso superior, as lições que as salas de aulas nos trazem diariamente. Como não tenho as respostas (se é que elas existem), peço ajuda aos universitários e divido neste artigo alguns das perguntas de caráter pedagógicos que, diariamente, faço.
- A tecnologia tem colaborado para a melhoria na qualidade do ensino?
Assim como todos os setores da sociedade, a educação não pode prescindir dos predicados da tecnologia, que auxilia a pesquisa, dinamiza processos, registra e arquiva conhecimentos, entre outros benefícios. Porém, aumenta gradativamente o número de alunos que levam seus laptops e desviam a atenção para as redes sociais, se tornando “ausentes” da matéria que está sendo dada pelo docente. Isto ocorre também no uso de celulares. Para enfrentar a situação, a maioria dos professores tem optado por impedir o uso dos computadores pessoais nas salas de aula. Muitos discentes, então, reclamam por se sentirem lesados com a proibição:- “Se existe a tecnologia- perguntam eles- porque somos impedidos de usá-la?”
Do outro lado, entre vários equipamentos tecnológicos, o projetor tem sido um dos recursos didáticos freqüentemente utilizado pelos docentes. O professor arquiva no pen drive a matéria a ser dada, formatada geralmente em PowerPoint, e comenta os slides com os alunos. O que tem acontecido é que muitos estudantes se “acomodam” com esta facilidade virtual. Há certa letargia, um “cansaço” aparente, dado que a excessiva utilização do recurso tem contribuído para que o aluno seja desviado para as conversas interpessoais, ou mesmo para um distanciamento do que está sendo apresentado. Ele sabe que o arquivo será disponibilizado de alguma forma pelo professor e acredita que é só “baixar” o conteúdo que os dados serão assimilados. Os próprios professores, por sua vez, correm também o risco de “produzirem aulas”, acomodarem-se e automatizarem a relação. Existem, claro, professores que ainda não abrem mão do quadro e do pincel. Mas, estes também têm demonstrado dúvidas com este método tradicional. Estariam os alunos tão ligados na tecnologia que desqualificam professores mais conservadores?

A ênfase nos conhecimentos técnicos tem formado melhores profissionais?
A competitividade é alimentada pela sociedade. Pais e professores querem preparar os filhos e alunos para se tornarem profissionais capacitados a enfrentar o mercado. Buscam-se teorias, técnicas, fundamentos científicos, na consciência comum de que estes instrumentos serão necessários para o melhor desempenho. E não há dúvidas que isto é fundamental. Porém, é notório que a ênfase dada apenas aos conhecimentos técnicos está ampliando as dificuldades de relacionamento entre os próprios alunos e estes com os professores. Os universitários demonstram problemas de convivência em grupo e comunicação interpessoal. Discretamente, e até com as melhores intenções, será que a educação não está incentivando apenas a competitividade, o consumo, o materialismo? Quais os reflexos isto provoca, por exemplo, na relação entre um médico recém formado e seu paciente?
Dirão, talvez, que aos pais, cabe a formação da personalidade e, aos professores, a intelectual. Será mesmo?
Existem muitas perguntas e as respostas são de múltipla escolha. O que não dá é que pais professores e estudantes continuem a vivenciar a educação, sem a reflexão permanente se estamos realmente preparando pessoas para atender pessoas, em qualquer área do conhecimento. É necessário acentuarmos a concordância de que só seremos sujeitos se utilizarmos de maneira adequada e equilibrada, os objetos. De novo, Paulo Freire; ”ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria”.

sábado, 17 de setembro de 2011

No princípio, tínhamos princípios

No princípio, nossos pais nos ensinaram que era preciso conquistar o pão de cada dia com o suor dos nossos rostos. Que dignidade era sinônimo de honestidade e palavra dada “no fio do bigode” era mais importante que documento registrado em cartório. Que o nome completo de uma pessoa era seu principal patrimônio e a caderneta do armazém deveria ser acertada sem atrasos no pagamento.
No princípio, “Quadrilha” era dança coletiva em festa junina ou mesmo um poema de Carlos Drummond de Andrade. Testamento tinha mais conotação religiosa e vinha geralmente depois da palavra Novo ou Velho e não era objeto de disputa familiar.
No princípio, vendíamos coisas, mas não comercializávamos pessoas e nem nossa honra. Comprado era verbo e não adjetivo. Cultivávamos o interesse em ter amigos e não os amigos por interesse. Não abríamos mão dos nossos valores, que norteavam nossos compromissos éticos e morais e estes não tinham preço.
No princípio, as promessas eram cumpridas e nem eram necessárias notas promissórias. As pessoas nos conheciam pelo que éramos e não pelo que possuíamos. O homem controlava o dinheiro e não ao contrário. A Palavra era propagada antes do dízimo e o crédito era baseado na confiança das pessoas e não em um cartão magnético.
No princípio, ficávamos indignados com a corrupção e assustados com as falcatruas. Comissão era o pagamento lícito pela venda lícita e não propina paga em licitações ilícitas. “Molhar a mão” era sem aspas e significava o ato de limpá-las e não de sujá-las. Existia o interesse público e não a propriedade privada. Caixa era um local de pagamento de contas ou nome de banco e não tinha o 2 depois. Emprego era associado à vaga e não a cabide. Lotear significava dividir um terreno em lotes e não era conjugado a cargos na administração pública.
“No princípio era o Verbo” e tínhamos princípios.
Hoje temos a verba e fins ilícitos.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O que há por trás do Habib´s

Poços de Caldas tem “fome” de crescimento e a gastronomia aqui é prova incontestável disto. Nas ultimas semanas, somente a Avenida João Pinheiro- uma das principais artérias da cidade- recebeu dois novos locais (uma franquia de renome e uma bonita churrascaria) o que reflete os investimentos crescentes neste setor. Se olharmos para a área central e para os bairros é visível o número cada vez maior de restaurantes, bares, lanchonetes, carrinhos de lanches, tornando cada vez mais diversificado “o cardápio” oferecido pelo município aos seus cidadãos e turistas. Todo este movimento deixa feliz e orgulhoso todos aqueles que torcem pelo desenvolvimento da cidade. Assim, a chegada recente de uma franquia de renome nacional e também a nova churrascaria, só para citar dois exemplos, trazem, além do que foi citado, mais recursos aos cofres públicos e geração de emprego e renda para dezenas de famílias. Tudo isto motivo de comemoração e alegria: empresários acreditando no potencial da cidade, pessoas recebendo qualificação e emprego, mais recursos aos cofres públicos, cidadãos e turistas com novas opções de lazer e entretenimento.
Mas, afinal, pergunta- com toda razão- o impaciente leitor: o que há por trás do Habib´s?
Calma, não é o que parece. O que pretendemos chamar atenção com o título desta matéria é que bem ali, por trás da franquia de comida árabe, estamos perdendo um patrimônio histórico: a “estrada de ferro da Mogyana”.
Para contextualizar o problema, valho-me de informações prestadas pelo jornalista Rubens Caruso, através de um documento: o dossiê de tombamento do patrimônio ferroviário de Poços de Caldas, datado de 2003 amparado pela Lei Municipal 5.376, de 1993, que tombou o conjunto arquitetônico da Estação Ferroviária do Município.
A história conta. Em 1886, Dom Pedro II esteve em Poços de Caldas para inaugurar o Ramal de Caldas – uma extensão da linha férrea da Mogyana e “única forma de ligação entre o vilarejo e os centros urbanos”. Após a inauguração, o movimento de pessoas interessadas em aproveitar as belezas da recém criada estância hidromineral, valendo-se da “Maria Fumaça” cresceu muito. “A Estrada de Ferro Mogyana passou então por um período de grande prosperidade, pois suas composições partiam lotadas de Campinas para cá. Seus trens passaram a ser, durante várias décadas, o meio de transporte preferido pelos viajantes à região da Mantiqueira, até que o aparecimento das estradas de rodagem pavimentadas, permitindo um percurso mais rápido e confortável, diminuiu o movimento da tradicional ferrovia. No final da década de 1990 a estrada foi desativada, passando a funcionar apenas para cargas a partir da estação da Bauxita e seus trilhos foram retirados do centro da cidade por volta de 1998”. (www.memoriadepocos.com.br)
Hoje, o Brasil rediscute a importância das ferrovias para o desenvolvimento comercial e turístico da nação. Em Poços de Caldas, o tema patrimônio ferroviário vive um momento conflitante com o desenvolvimento da cidade, que fingimos não ver. É como se tivéssemos dois vagões em direções contrárias e o choque fosse inevitável. Mas, onde se encontram os “maquinistas”?
Não se discute que os empreendimentos trazem desenvolvimento ao município. Não se discute também a legalidade dos pontos comerciais que avançam hoje sobre o leito da ferrovia, pois, ao que nos parece, os proprietários adquiriram legalmente o direito de usufruir do espaço.
O que se deve refletir é como deixamos isto acontecer? De quem é a responsabilidade? Há condições de reverter este processo? Ou o melhor é esquecer a ferrovia e sepultar os trilhos da história?
Quando atentamos para um novo projeto da administração atual (muito louvável por sinal) de padronizar todos os carrinhos de lanches próximos ao parque José Affonso Junqueira, onde todos os boxes terão a imagem “de vagões de trens” refletimos: os vagões da gastronomia entrando em cena e os vagões da Mogyana sendo descarrilados.
Outra idéia, a de transformar o leito da ferrovia em uma avenida para desafogar o trânsito da João Pinheiro, foi descartada, até porque, o espaço físico impossibilitaria tal iniciativa.
Para finalizar, pois este texto já está maior que a malha ferroviária européia, o problema é escolher qual caminho queremos trilhar. Assim como o monotrilho, (olha o trilho aí de novo, gente), ou damos o assunto por encerrado e deixamos as linhas do trem ocupar apenas a nossa memória, ou, realmente encaramos o problema para a busca de soluções. O que não dá é falar de patrimônio histórico e não cuidarmos nem do patrimônio e muito menos da história.
Para encerrar, um provérbio árabe: “a árvore quando está sendo cortada, observa com tristeza que o cabo do machado é de madeira”.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O lixo nosso de cada dia

Quando a questão é ambiental, sou réu confesso, como, acredito, milhões de pessoas no planeta Terra. Considerava há algum tempo atrás, “ecochatos” e “biodesagradaveis” pessoas que vinham com papo de meio ambiente e preservação das espécies. Claro, sempre busquei fazer o meu “dever de casa”: jogar o lixo no lixo, economizar água e energia elétrica, (muito mais em razão do bolso estar “reclamando”) e hoje, até separo o lixo úmido do seco. Enfim, apesar destas atitudes, sabia conscientemente que pensava mais em meu ambiente individual que no meio ambiente coletivo.
Mas, assim como milhões de pessoas no planeta Terra, venho refletindo a necessidade de rever meus conceitos, na percepção dos sinais claros do cansaço do meio ambiente em relação ao nosso “descanso” ou descaso ambiental. Um destes sinais é a alteração climática: em Poços de Caldas, por exemplo, reconhecidamente um município de temperatura amena, tem sido registrado altas temperaturas durante o ano todo e o inverno hoje é apenas uma “frente fria passageira”. Pelo Brasil e no mundo, as catástrofes ambientais (furacões, terremotos, tsunamis, inundações) acontecem cada vez em maior número, o que demonstra que nossas ações estão gerando reações na mãe natureza. Isto para não citar as endemias, a escassez de alimentos e de água e outras conseqüências no ecossistema. Se, existem as leis da natureza e podemos aprender muito com elas, que soluções as leis humanas têm em relação ao problema ambiental?
No Brasil, a Constituição Federal determina que o município é o responsável pela limpeza urbana, coleta e destino final do lixo produzido. Ainda mais: o governo federal sancionou em agosto de 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) estabelecendo como responsáveis pela destinação de resíduos sólidos, todos os integrantes da cadeia: poder público, iniciativa privada, instituições e consumidores. Ou seja, os nós ambientais são de responsabilidade de todos nós. Além disso, determina à lei, as cidades brasileiras têm a obrigação de acabar com os lixões a céu aberto até agosto de 2014. E como inicialmente o melhor é cuidar bem do “nosso quintal”, o que Poços de Caldas faz atualmente para se destacar em um cenário composto por 5.565 municípios brasileiros?
Nossa cidade- que tem a qualidade de vida como o seu maior refrão- necessita urgentemente priorizar as questões ligadas ao meio ambiente. Para isto, como está nossa coleta seletiva? E a cooperativa de catadores? E o nosso lixão, opps, quer dizer, o nosso aterro controlado? E o nosso tratamento de esgoto? Vamos ou não criar a nossa Política Municipal de Resíduos Sólidos?
Como cidade modelo em vários aspectos, por que não nos destacarmos como cidade ecologicamente responsável? Que tal uma campanha maciça de educação ambiental? E a iniciativa privada, o que este setor faz para assumir a sua responsabilidade nesta questão? Por que não realizar, assim como fez recentente a vizinha cidade de São João da Boa Vista, um Fórum para discutir seriamente tais questões, incluindo a participação popular?
O assunto é amplo e complexo, mas, merece a participação de todos, inclusive a deste redator, pleiteando enfim, sua inscrição, com muito prazer, na Associação dos “ecochatos e biodesagradáveis” acreditando que “muitas pequenas pessoas em muitos pequenos lugares fazendo pequenas coisas, podem, realmente, mudar o mundo”.